Leitor,
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Leia!
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SE ACREDITA QUE A INTELIGÊNCIA

SE FIXOU TODINHA EM LISBOA

NAO ENTRE NESTE ESPAÇO...

Motivo: A "QUINTA LUSITANA "

ESTÁ SITUADA NA PROVÍNCIA...

QUEM TE AVISA, TEU AMIGO É...

e cordialmente se subscreve,
Brasilino Godinho

terça-feira, setembro 23, 2014

As inundações em Lisboa
Urge conhecer as causas

Brasilino Godinho

O que se passou ontem em Lisboa, o clima de aflições, e os prejuízos provocados pelas inundações ocorridas entre as 14 e as 15 horas, obrigam-me a interromper o meu jejum de escrita.
E a razão é que as ocorrências das cheias em Portugal sucedem-se sempre com os mesmos efeitos destruidores e não se encara seriamente a problemática que as envolve e o desleixo das entidades oficiais a quem cumpre zelar pela coisa pública.
Mais acrescento a nota pessoal da indignação que sinto sempre que se verificam tais situações dramáticas.
É que já perdi a conta ao número de anos decorridos desde que, pela primeira vez, escrevi uma crónica sobre o grave problema das inundações. Desde então tenho escrito bastante sobre o tema.
Num telejornal da noite de ontem, passou uma peça de reportagem que, sendo caricata, também era elucidativa da incúria das autoridades. Na imagem de uma via pública onde a massa líquida teria quarenta centímetros de altura e o caudal atingia alta velocidade, via-se um homem que, empunhando uma vara, tentava, em atitude aflitiva, desentupir uma sarjeta submersa – a jornalista deu mesmo essa informação de natureza operacional.
Pois, assim se fez a elucidativa demonstração do cerne da questão das inundações citadinas. Uma eloquente peça televisiva sobre a incompetência e incúria de certos serviços da administração pública.
Vejamos.
Sabemos que as variações climatéricas propiciam fenómenos de extrema gravidade. A natureza está frequentemente a surpreender-nos. E se não podemos prever e enfrentar em segurança de vidas e de bens as tempestades, cumpre às autoridades e aos serviços de protecção civil prepararem-se para nas horas dramáticas actuarem com eficácia, minimizando os estragos.
Mas no que concerne ao grande problema das súbitas e devastadoras inundações nas povoações, tem faltado a competente e diligente actuação das autarquias nos domínios da previsão, da permeabilidade dos solos e da elaboração dos projectos, da construção e da manutenção das redes de saneamento básico.
De facto, a gravidade das causas do problema não se circunscreve somente aos efeitos devastadores das chuvadas críticas que acontecem imprevistamente. Ela radica num tempo anterior e dependente da seriedade e competência com que se procede nas fases de projecto, construção e manutenção das redes de esgotos. Ou seja, quando se elaboram os projectos das redes de esgotos de um aglomerado e se deve aplicar nos cálculos de dimensionamento dos calibres dos colectores os valores das previsões dos caudais admitidos como os mais elevados que ocorrem numa situação extrema e tendo em conta os índices de pluviosidade apurados pelo Instituto Meteorológico nas respectivas bacias hidrográficas Depois na construção deve haver o cuidado e rigor no cumprimento do projecto. A partir da entrada em funcionamento da rede de esgotos deve haver a prática continuada do desentupimento das sarjetas e das acções de limpeza e desobstrção efectuadas nos colectores a partir das câmaras de corrente de varrer e das câmaras de visita.
É precisamente na aplicação destas básicas regras aqui enunciadas que têm falhado os serviços públicos relacionados com o saneamento básico das populações. O que geralmente acontece por vários motivos que podemos elucidar sucintamente.
Em primeiro lugar, por incompetência ou cedência dos projectistas sujeitos a pressões das autarquias para reduzir os orçamentos das obras - o que é feito com perdas de qualidade e deficiência no funcionamento das redes que acabam por serem projectadas e construídas com manilhas de menor calibre do que estaria indicado e dando azo a que em situações de chuvadas críticas não dão escoamento aos caudais que a elas afluem – vejam-se as reportagens televisivas em que as ruas mais parecem rios caudalosos.
Depois, já em tempo de construção, sucedem-se alterações nos dimensionamentos dos colectores e na distribuição das câmaras, quer por falta de fiscalização, quer por imposições de natureza económica – procurando-se fazer muito com pouco dinheiro.
Após a data de entrada em funcionamento da rede de esgotos, por via de regra, nem serviços técnicos, nem presidente da autarquia, nem a câmara de vereadores, se preocupam com a manutenção periódica do sistema de esgotos.
Outro factor importante tem a ver com a intensa impermeabilização dos solos que se vem processando nas cidades e vilas de Portugal. As autoridades municipais mostram-se alheadas da gravidade desta situação que um dia, como sucedeu ontem em Lisboa, surge em toda a sua enorme dimensão.
O que deixo expresso nesta crónica é o quadro impressivo de uma realidade sempre escamoteada pelos poderes públicos e pela comunicação social.

Por último, formulo três observações:
- No final dos anos cinquenta entidades superiores de Lisboa afirmavam que estava em curso de elaboração o projecto das redes de esgotos da Av. 24 de Julho, de Alcântara e da baixa pombalina e que, dada a amplitude do seu dimensionamento, estava garantido o regular escoamento das águas pluviais. O que vemos quando há uma chuvada não muito exagerada naquela zona lisboeta? Cheia, pela certa.
- Há cerca de dez anos aconteceu o incrível em Aveiro: uma inundação na zona alta da cidade. Escândalo, convenientemente abafado…
Os serviços responsáveis mantiveram-se impávidos, sem tugir, nem mugir. Comentei o facto numa crónica. Os dirigentes camarários assobiaram para o lado…
- Para que não se diga que falo por falar, devo afirmar que foram construídas em diferentes localidades deste país redes de saneamento básico projectadas sobre a minha orientação, que têm funcionado com regularidade. Jamais (e com muitos anos de existência), nos respectivos locais, houve ocorrência de inundações devidas a deficiente funcionamento dessas redes de esgotos.
Para que conste!...
Fim