Um texto sem tabus…
AEROPORTO DA OTA
– A OBSCURA, TAMANHA, ASOFIA…
Brasilino Godinho
http://quintalusitana.blogspot.com
Acontece com o caso do aeroporto da Ota o mesmo que se passa com a pescada, tenha ela ou não o rabo na boca… Antes de o ser já o era…
Vá em frente a obra na Ota, seja concluída e posta a funcionar ou, em alternativa, venha a ser escolhida outra localização do novo aeroporto internacional (agora, surgiu a hipótese de Alcochete), o certo é que não se modificará a conclusão a extrair que decorre do arrastamento do processo ao longo dos extensos, derradeiros, quarenta anos.
Que conclusão? Aquela que assenta no vocábulo: asofia. Expressão que significa: ignorância; falha de juízo; falta de prudência.
Expliquemo-nos.
A rapaziada que desgoverna este país e os senhores empresários e ricaços que detém as rédeas do poder económico-financeiro e presidem às associações corporativas ainda não teriam nascido ou seriam frágeis criancinhas nos meados dos anos cinquenta e já, nessa época, se falava na exigência de se substituir a médio prazo o Aeroporto da Portela, sito em Lisboa, cerca das avenidas novas e Praça do Areeiro. Contados vão cinquenta anos. Precisamente, nesse tempo o Aeroporto da Portela iniciou um ciclo de obras provisórias, ampliações de instalações, arranjos e modificações que se têm mantido quase ininterruptamente. Sempre na perspectiva de abandono do aeroporto existente e construção da nova infra-estrutura aeronáutica. E, desde logo, se foram aventando diferentes locais e se iniciaram os estudos para a sua localização. Mas esses trabalhos preliminares foram sendo conduzidos nas calmas e sem grandes avanços nos anos sessenta e setenta. Para o que terão contribuído as dificuldades financeiras suscitadas pelos esforços de condução das guerras nas colónias. No final dos anos oitenta as preocupações com a saturação do Aeroporto da Portela voltaram à ribalta e o processo de construção do futuro aeroporto toma novo alento no ano de 1990. E nos últimos dezassete anos os estudos prosseguiram e foi-se sedimentando a ideia de a Ota ser o melhor local. E nesse sentido se orientaram os estudos. Embora de quando em vez se apontassem outras localizações na margem sul do Rio Tejo. Até que chegados aos tempos dos governos de Guterres, Durão Barroso, Santana Lopes, se deram passos significativos no desenvolvimento dos estudos e do projecto do próprio aeroporto a ser localizado na Ota. Inclusive, o governo de Durão Barroso prosseguiu diligências na Comissão Europeia para assegurar participação financeira para a execução da obra – o que terá conseguido.
O actual governo seguindo as pisadas dos que o antecederam resolveu avançar em força na concretização dos estudos e elaboração do projecto de execução do novo aeroporto da Ota.
Eis senão quando nos últimos meses se desencadeou um intenso clamor contra a localização do aeroporto na Ota.
E aqui a porca torce o rabo…
Sem esquecermos que ao longo dos anos se foram ouvindo algumas vozes contra a ideia de extinguir o Aeroporto da Portela ou a favor de outras localizações, nunca as contestações à solução Ota atingiram tanta expressão e virulência como agora. O político João Soares e outras pessoas insistem em ter o aeroporto dentro de Lisboa - se fosse possível até à porta da residência… Outros movem-se por interesses próprios e de índole corporativa. Mas é cada vez maior o número daqueles que alinham com recomendações dos especialistas das várias matérias concernentes ao objecto em causa: o novo aeroporto. As opiniões divergem e extremaram-se correntes sobre várias hipóteses de abordagem do problema; cada uma com a sua particular visão sobre matéria que é de grande complexidade técnica, de profunda convergência de interesses, de extraordinária influência no desenvolvimento do país e com enormes implicações de natureza política.
Estamos face a um problema de tão vasta magnitude para a escala do pequeno país, Portugal, que todos os cuidados serão poucos na sua análise e na busca da melhor solução possível.
Por isso, consideramos pertinente pôr as seguintes questões:
- A manutenção do Aeroporto da Portela é insustentável por diversas razões que têm vindo a público. As que mais sobrelevam são a insegurança e a saturação - ao ponto de as rotas de alguns aviões serem desviados para outras paragens. Os lisboetas estão habituados à rotina diário dos voos e já nem se dão conta do ruído e do perigo que representa os aviões passarem quase a rasar os telhados dos edifícios da Av. de Roma e das torres da Praça do Areeiro. Sabe-se que têm havido ocasiões em que esteve iminente a tragédia de uma queda sobre a zona urbana da cidade, de que não foi dada divulgação para não gerar sobressaltos na opinião pública.
- Na solução Ota o funcionamento das pistas será condicionado e com riscos de rotas de colisão? A ocorrência de turbulências e proximidade da montanha, são factores de extrema perigosidade demasiado frequentes naquele local?
- Sendo na montanha adjacente ao perímetro do futuro aeroporto (por razões de embaratecimento dos custos de transportes) contraídos os empréstimos de milhões de metros cúbicos de terras a aplicar nos elevados volumes de aterros necessários nas terraplenagens, a alteração topográfica do terreno não determinará a modificação ou eliminação das condições hoje apontadas como desfavoráveis nos corredores de aproximação às pistas, na formação de nevoeiros e na inviabilidade de ampliação do aeroporto a localizar na Ota? Estes aspectos já foram contemplados nos estudos entretanto efectuados?
- Será possível que um governo responsável se permita decidir a construção de uma tão dispendiosa infra-estrutura aeroportuária com um horizonte de plena utilização reduzido a 18 anos? E sem possibilidades de ampliação? Isto que é afirmado pelos críticos da opção Ota corresponde à verdade?
- Na margem sul há a considerar as zonas protegidas em que se concentram numerosos afluxos de aves migratórias. Não menos importante sob o prisma da segurança do transporte aéreo é o perigo que as aves representam para os aviões em voo porque são facilmente sugadas pelas turbinas dos reactores.
- Na margem sul existem importantes aquíferos e reservas naturais a preservar a todo o custo.
Ainda, uma pergunta inquietante: não haveriam sérios riscos de insegurança e de catástrofe com o novo aeroporto implantado na margem sul do Rio Tejo, assente num solo que cobre a maior e mais activa falha tectónica existente em Portugal; a qual, se estende a partir de Lisboa no sentido norte-sul, por Setúbal, Alcácer do Sal, até ao Algarve? Nota insólita e inquietante: estes, são dois aspectos associados, extremamente importantes, que nunca aparecem aflorados nas discussões sobre a localização do novo aeroporto nacional. Porquê? E como “esquecê-los”? Ninguém se lembra de consultar os peritos em Sismologia, Geologia e Mecânica dos Solos?
Outras considerações pertinentes sobre este tema serão apresentadas numa próxima crónica.
Fim
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