Um texto sem tabus…
NA FARSA DO ABSURDO CONCURSO
A RTP FOI DESRESPEITADORA
E IRRESPONSÁVEL …
Brasilino Godinho
A RTP - Rádio Televisão de Portugal tem a sede localizada
Desde que uma conhecida bióloga da nata alfacinha se permitiu a desfaçatez de copiar (traduzindo) dois artigos de uma publicação norte-americana alegando que o fez por estar cansada, os plágios passaram a integrar o modus-faciendi de muita rapaziada do meio intelectual lisboeta. Um regalo compensador facilmente desfrutável como, aliás, sucedera com a percursora que, despedida de imediato da revista onde inserira a matéria plagiada, quinze dias depois era reabilitada com espantável fotografia de capa e grande entrevista nas páginas centrais de uma revista do mesmo grupo editorial. Se bem nos lembramos a desenrascada senhora chegava ao ponto de afirmar que tinha muito orgulho do plágio que cometera. Bonito! Exemplar! Educativo! Mais de notar tratando-se de uma professora… E hoje aí está ela aparecendo radiante, à-vontade, por tudo que é sítio de exposição pública, pelas televisões e focada pelas diversas publicações cor-de-rosa que reportam as noitadas e os deboches da fina-flor que frequenta as discotecas da Av. 24 de Julho, em Lisboa e da linha de Cascais.
Mas como íamos dizendo, por norma de programação, abusa-se da prática de copiar as ideias e os programas das entidades congéneres do estrangeiro. Do mesmo modo inconsciente se aceita tudo o que vem de além fronteiras. Os produtos originários doutros países são sempre melhores que os nossos. E aceitáveis, sem discussão ou juízo crítico. Às cegas, como sucedeu com o estapafúrdico formato do concurso da TV inglesa que a Maria Elisa puxou para si durante a sua estadia em Londres e não esqueceu na bagagem com que se apresentou na sede da RTP.
Por isso, todo o mundo da saloia região de Lisboa se acomodou à iniciativa da Maria Elisa de reproduzir na RTP o imbecil concurso da televisão inglesa no qual apareceu em terceiro lugar a virtuosa princesa Diana… O idêntico que foi lançado pela RTP tinha por fim a escolha do “maior português de sempre”. Do lado de cá, na paisagem circundante a Lisboa e para não fugir à regra, certa malta acomodou-se e, alegremente, entrou na brincadeira de mau gosto.
Não é por causa da classificação atribuída no grande final que verberamos a realização do famigerado concurso. Mas sim porque o disparate é aquilo que é: uma inequívoca tolice. E não fora o alarido e a confusão que vai por aí a baralhar as mentes de cidadãos influenciáveis, nem valeria a pena gastar tempo a comentar o absurdo. Porém, esta é a situação e não devemos ignorá-la.
Cumpre-nos frisar o seguinte: logo que o dito concurso foi anunciado reagimos e viemos a público denunciar a insólita, descabida, e inqualificável realização. Nessa altura, empenhámo-nos em demonstrar que a RTP se interessa muito pelas audiências e pelo que julga ser um chamariz para as alcançar. E pouco por aquilo que, nos domínios da Cultura, pode contribuir para a elevação intelectual do Zé-Povinho. Mais, dizíamos que a evocada utilidade de levar os portugueses a interessarem-se pela História carecia de fundamento e objectividade, atendendo ao reconhecido desinteresse das estações de televisão pela Cultura e - como se provou - ao alheamento dos votantes sobre as figuras que marcaram efectivamente a evolução e a glória do País. O proveitoso ensino da História pelas televisões e o interesse por ela não se conseguem com espectáculos ligeiros, estupidificantes e de controvérsia entre os seus actores; mas através de programas culturais devidamente estruturados a cargo de especialistas, transmitidos em horários acessíveis ao grande público. Ao contrário daquilo que faz a RTP quando decide transmitir alguma peça de carácter cultural e a relega para horas mortas de fraquíssima audiência.
Depois e mais relevante é a inabalável certeza que ninguém está em condições ou dispõe de capacidade para classificar uma personalidade como o maior português. Ou o pior português, à semelhança do que, em contraposição e com algum sentido de espírito de animação da polémica, fez a SIC. Por sinal, com o mesmo vencedor: Salazar. Engraçado… Salazar conseguiu o pleno: ser o melhor e o pior português Desfechos bastantes elucidativos da credibilidade destes concursos. Que só servem para mostrar as fraquezas e os voluntarismos de certa gente.
Logo, o concurso da Maria Elisa e da RTP foi uma anormalidade cultural, uma abjecção cívica, um abominável expediente de ocupação de tempos de antena. Pior, ainda, as visitas às escolas, com a finalidade de chamar a atenção das crianças para o desenrolar do espectáculo. O que terá sido um aberrante processo dotado de todos os elementos capazes de subverter a aprendizagem da História. Decididamente: Uma brincadeira intolerável. Não se brinca com coisas sérias. Há limites de indecência e de precariedade mental que nem devem ser atingidos; muito menos ultrapassados - como aconteceu nos tristes acontecimentos que animaram a paródia televisiva. Sim, tratou-se de uma irracionalidade!
Por outro lado, sobressaiu uma enorme falta de respeito pela memória de muitos portugueses que, ao longo dos tempos, dignificaram a Pátria. Foi cometido um abuso imperdoável. Com que direito se veio dizer que eles eram “candidatos”. Como assim? Eles, a partir do outro mundo etéreo onde se encontram, passaram procuração a alguém para os “candidatarem”? Com que prerrogativas e direitos de exploração da imagem de cada um deles a RTP e a Maria Elisa se permitiram utilizar os nomes e as memórias das personalidades históricas num concurso de selecção a macaquear os concursos das meninas para apurar a mais bela e as competições de popularidade dos artistas e dos futebolistas? Que resultou de determinante da deplorável iniciativa? Nada! Eventualmente, restará para a posteridade uma vaga lembrança de um espectáculo ridículo e de uma coisa sem nexo.
Mesmo os dois vencedores nunca admitiriam serem incluídos em semelhante palhaçada de muito mau gosto. Quem conheceu os seus percursos de vida não terá dúvidas acerca do repúdio que a ideia lhes mereceria. Uns e outros, dos muitos portugueses ilustres envolvidos pela Elisa e companhia na estúpida disputa, não mereciam tamanho ultraje. Espanta que naquela casa não tivesse havido um administrador, um director, um qualquer cidadão responsável com sentido das conveniências e a percepção do ridículo que se opusesse a tempo de evitar o “gratuito” atentado à Ética, ao respeito que devemos a vivos e a mortos e ao supremo valor da Responsabilidade. Quem colaborou na pantomina deu prova de arrepiante tacanhez de espírito. Aquele insólito espectáculo em que colaboraram professores, jornalistas e políticos – representando, a título individual, uma confrangedora e perturbante intervenção que se julgaria inviável - merece a condenação dos portugueses que se revêem nos valores das faculdades de alma (inteligência, seriedade intelectual, clareza de raciocínio, sentido crítico) e no respeito que devemos à memória dos mortos e a nós próprios.
A RTP foi desrespeitadora e irresponsável.
Todos que colaboraram na farsa ficaram mal na fotografia…
Felizmente que de tal evento se destacou uma consoladora realidade: numa população de dez milhões de pessoas apenas uma ínfima percentagem, que não chegou aos dois por cento, se mobilizou para partilhar do disparate. Apesar da intensa propaganda desenvolvida por todo o País pela RTP, pela Internet e com recurso aos mais variados meios publicitários.
Valha-nos isso! Em exaltação do bom senso do Zé-Povinho.
Enfim, nem tudo corre de feição para a bicharada que nos atenaza…
Fim
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