Um texto sem tabus…
AS NOVAS CORTES…
AGORA, EM CORTES-LEIRIA…
Brasilino Godinho
As Cortes remontam ao tempo da Monarquia. Inicialmente, eram assembleias dos representantes do Clero, da Nobreza e do Povo convocadas pelo soberano reinante. E que se realizavam sob a presidência de Sua Alteza. Geralmente ocorriam espaçadas no tempo, sem datas predeterminadas e para debaterem assuntos da maior importância para o Reino.
Com o advento da República as Cortes foram substituídas pela Câmara dos Deputados, a qual reunia com regular frequência durante o período de cada legislatura.
No entanto, já na vigência da actual terceira república registou-se a particularidade de a suprema magistratura do Estado ter sido ocupada por uma alta individualidade – o Dr. Mário Nobre Soares - a quem no consenso público se atribuiu o estatuto invulgar de Presidente-Rei. É um caso único na História de Portugal.
Claro que sendo o apelido Nobre um indício de uma virtual ascendência com sangue azul e, possivelmente, corresponder a um qualquer vínculo ao ideal monárquico, ao tempo, o facto não deu azo à relutância do povoléu; nem a titularidade da função de Chefe do Estado com tão esquisita formulação provocou qualquer embaraço no seio da corte de D. Soares I, alguma estranheza nos frequentadores dos Passos Perdidos do Palácio de S. Bento ou aborrecido incómodo nos fiéis adoradores do templo da venerável fraternidade – estes últimos conhecidos por serem, habitualmente, muito intolerantes com irrelevantes heresias e pequenos desvios de ordem funcional…
E se o Presidente-Rei, D. Mário Soares I, enquanto no exercício da sua altíssima magistratura, nunca deu realce público às suas cortes reunidas em ocasionais conclaves; certo é que expirado o prazo de validade da sua presidencial-real dignidade e remetido à condição de presidente da Fundação Mário Soares vem dando expressão mediática às celebrações dessas assembleias, representadas no formato de jantares-conferências que, por regra, acontecem na Casa-Museu João Soares, sita na povoação de Cortes, concelho de Leiria.
Dada a convergência dos factores de nobreza, presidência e realeza do mentor, do aparato do cenário, da natureza dos assuntos postos à consideração dos participantes, da ressonância do evento nos meios de comunicação social e da fama dos ilustres conferencistas, pode dizer-se, com propriedade, que estes selectos encontros, sempre revestidos da maior solenidade e celebrados com obediência a protocolo e ritual próprios, são as modernas cortes que, sem dúvida, constituem brilhantes ornamentos da república que, indígenas, usufruímos com aquele mínimo proveito autorizado pelos governantes; estes, certamente guiados pelas suas excelsas e misericordiosas almas e pela validade e oportunismo das suas desconsertadas e inapeláveis competências…
É notório que as cortes do ex-Presidente-Rei, D. Mário Soares, prosseguem três objectivos: manter viva a tradição das Cortes; dilatar, num prolongado tempo, o fulgor da presidencial reinação de D. Soares I; e estabelecer sólidas bases de continuidade da nova dinastia soarina (de matriz híbrida repúblico-monárquica).
Por outro prisma, as Cortes do ex-Presidente-Rei evidenciam um expressivo cunho de modernidade. Desde logo, porque enquanto nas antigas cortes assentavam os membros do Clero, da Nobreza e do Povo, nas actuais, presididas pelo D. Mário Nobre Soares, não têm assento os representantes do Povo. Também se nota a ausência dos clérigos. E quanto a nobres a selecção faz-se no círculo restrito da fraternidade que se revê e se deslumbra no grande horizonte do não menos grande oriente lusitano…
O facto de estarmos a falar das cortes de D. Soares I tem a ver com a última realizada nos Cortes no p.p. dia 22 de Novembro.
Desta vez, as Cortes contaram com a presença do ex-presidente da República Jorge Sampaio que foi o orador de serviço. Segundo foi noticiado o Dr.Jorge Sampaio dissertou sobre Portugal – cuja afirmação como “país não se mede em função da dimensão do território ou do PIB (Produto Interno Bruto) mas da sua capacidade de se afirmar como parceiro credível, empenhado em contribuir efectiva e activamente para a resolução dos problemas e para o desenvolvimento de políticas inovadoras”.
Interrompemos a citação para tentarmos perceber… O país e o PIB são pequenos; todos sabemos. Nada a opor... Mas, será que “o país se mede em função da capacidade de se afirmar como parceiro credível”? Medir o país? Ao metro? Ao quilómetro? Em área? Quem está interessado em medi-lo? Algum português? Desnorteado estrangeiro? Porquê medi-lo? Parceiro credível em relação a quem? E por que ser credível para outrem que não em primeiro lugar para nós mesmos? Igualmente, “empenhado em contribuir efectiva e activamente para a resolução dos problemas”. Quais problemas? Dos outros países? Dos imensos que nos dizem directamente respeito? Do exorbitante poder da Maçonaria na governação e nos sectores vitais da sociedade portuguesa? Da Educação? Da Saúde? Do Ensino? Da Economia? Do Comércio Externo? Do Orçamento? Da Justiça? Da Segurança Pública? Da Cultura? Do abandono e maus-tratos dados à Língua Portuguesa em Portugal e na Diáspora? Do Ambiente? Da questão de Olivença? Da censura que se faz às escondidas em Portugal? Das autonomias dos Açores e da Madeira? Do futebol? Da pedofilia? Da fraude fiscal? Da excessiva produção de “tachos”? Do descomunal abismo entre os ricos e os pobres? Da corrupção? Do tráfico de influências? Das clientelas partidárias na Administração e na Função Pública? Dos enormes gastos com os funcionamentos da Presidência da República, do Governo e da Assembleia da República? Da falta de seriedade e ausência de ética na política em Portugal? Ou o Dr. Sampaio quer referir-se aos problemas da Geometria? Da Matemática? Da Física? Da Química? – os quais tanto perturbam os discentes das escolas. Da linguística? - que estão chagando a paciência dos estudantes e professores de Português, dos ensinos básico e secundário.
Do mesmo modo, o que se depreende da contribuição efectiva “para o desenvolvimento de políticas inovadoras”? Quais políticas? Em que áreas? Com que objectivos? Para aplicação em Portugal? Na Comunidade Europeia? Ou praticadas à escala mundial? Inovadoras? Prestáveis, com boa utilização? Ou tão inúteis e de maus resultados que melhor será rejeitá-las à nascença?
Depois o ex-presidente foi dizendo que “(…) um país como o nosso(…) e com as necessidades derivadas do seu perfil, será determinante apostar numa política externa dinâmica, forte e adaptada às realidades do nosso tempo”. Ao lermos esta passagem ficam-nos as dúvidas: Qual é o perfil de Portugal? E quais são “as necessidades derivadas do seu perfil”? E se as ditas “necessidades derivadas do seu perfil” determinam uma política externa dinâmica e forte, o que se pode entender como política forte derivada das necessidades do perfil de um país tido e achado como fraco? Aliás, é mesmo o perfil que impõe as necessidades? Não será a Nação? E as precárias condições de vida dos portugueses que determinam as necessidades? E que fazer com as eventuais necessidades que nem sejam derivadas do famigerado perfil? Como destrinçar umas e outras? Ainda uma interrogação: em que medida as necessidades derivadas do perfil de Portugal podem determinar a aposta numa “política externa dinâmica e forte”? Presumindo que as necessidades são muitas que se originam e revertem na fragilidade do perfil (fraco de sua natureza) como admitir uma política externa forte e dinâmica? Onde buscar a fortaleza e o dinamismo? E essa hipotética política externa iria suprir as necessidades derivadas do perfil de Portugal?
Em vista disto, anotamos que o Dr. Jorge Sampaio tem o condão de nos deixar baralhados…
Ainda na intervenção deste ex-presidente da República, houve um aspecto importante que os jornais não salientaram: a sua autocrítica. Foi muito notada a repetida declaração: nesta altura sinto mais liberdade para me pronunciar sobre a situação política e o estado do País. Assim, o Dr. Sampaio está descobrindo, com redobrada atenção, que a prioridade é a Educação. E que falta justiça social.
Pois tarde fez a descoberta… Sem responsabilidades de natureza institucional o ex-presidente da República, Jorge Sampaio, veio reconhecer que, antes, andou como um vulgar actor do teatro político a fazer-de-conta que não se apercebia da gravidade do real estado político-social da Nação.
Enfim, agora, parte dele a confirmação do acerto das nossas muitas críticas às suas actuações como presidente da República Portuguesa. Melhor teria sido para o povo que não tivéssemos razão.
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