UM DIA DE AZARADO CONTRASTE SOLAR…
Brasilino Godinho
1. Ontem, dia15 de Maio de 2015, com o Sol, a estrela que é o
centro do nosso sistema planetário, a irradiar brilho e calor no espaço
lusitano, veio de Lisboa um pequeno corpo terrestre designado de SOL, encoberto
de nuvens cinzentas onde paira um indizível coelho. A singular estrela do
universo jornalístico, para além de estar desprovida de brilho transmite uma
estranha sensação de frialdade que, decerto, enregela as almas de muitos
portugas. Pior que isso, a dita estrela por força de desviantes caprichos da
Natureza tende a exercer deletéria influência sobre as pessoas mais atreitas à
ingenuidade, ao conformismo e, sobremodo, propensas à manipulação.
2. O SOL, na edição de ontem, publica a grande entrevista com
Passos Coelho.
Logo na primeira página a
manchete: ‘Não há qualquer hipótese de um governo com o PS’. Ali exposto
o primeiro equívoco do jornal e do entrevistado. Por que se colocam duas
hipóteses: Primeira: não há qualquer hipótese de o próximo governo ser do PS,
considerando que vai perder as eleições. Segunda, não há qualquer hipótese de a
coligação formar governo com o PS.
Se quanto à primeira ela traduz a
crença de Coelho em ganhar as eleições; quanto à segunda parece corresponder à
posição do PS em rejeitar, liminarmente, tal ideia.
3. Folheando o jornal contemplam-se várias fotografias relacionadas
com a entrevista.
É interessante repararmos nelas.
Nalgumas sobressaem as peças escritas que cada um dos entrevistadores exibe em
contraste com o entrevistado que tem sempre as mãos livres para gesticular – uma
falha que destoa no cenário…
Em todas as fotos de Passos
Coelho se representam imagens de intrigantes movimentos de mãos e de dedos,
associados a variações faciais que, provavelmente, despertarão interesse de
interpretação e análise a especialistas de linguagem gestual. E neste domínio
de expressividade coelhal se centra o grande contributo do SOL em concitar a
atenção do público para a transcendente singularidade e importância de tal linguagem.
Sem esquecer a impressionante colaboração artística do praticante de trabalho
de mãos e de dedos, Passos Coelho.
4. Concentrando-nos no teor da extensa entrevista diremos que, na
generalidade, repete o discurso habitual, não traz novidades substantivas, nem
informação quanto ao programa eleitoral do PSD. Explana-se em apreciações muito
lisonjeiras (mal procede, quem a si próprio se julga e muito se valoriza; visto
e entendido que presunção e água benta cada coelho governamental toma a que
quer) sobre as políticas do governo que chefia, a que junta algumas observações;
quais lugares comuns por demais repetidos até à exaustão.
5. No entanto, Passos Coelho debitou frases - quais pérolas que, ao
correr do tempo, nos vem apresentando com insistência desmedida - que vale a
pena reter pelo que relevam de jocoso e de surpreendente.
Com a devida vénia ao SOL e
agradecendo-lhe a oportunidade e o empenho de nos facultar o desfrute da beleza
perolífera de marca Passos Coelho com que, nesta data, enriqueceu o mercado
eleitoral, transcrevemos as seguintes pérolas:
Primeira, “No que respeita à questão com a Segurança Social,
respondi com total lisura e honestidade: não sabia que tinha aquela dívida e
durante o período em que era suposto ter feito aqueles descontos julguei que
eles eram opcionais e, portanto, não estaria obrigado a fazê-los.” (…) “Quem
está na vida pública deve ter sempre a preocupação de não dar maus exemplos.”
Disse Passos Coelho que respondeu
com total lisura e honestidade. Interrogamo-nos: o que será total lisura e
total honestidade? E lisura e honestidade que não sejam total uma e total a
outra? E, simplesmente, lisura e honestidade, são-no de forma redutora e muito
minguada?
Entenda-se: Passos Coelho joga
naquilo que lhe parece mais afirmativo e de segura aceitação do pacóvio
indígena. Por isso, exagera no alheamento da escorreita linguagem em português.
Acaba por se enredar num discurso amorfo. Pegando-lhe na palavra: totalmente, piroso.
Conforme indicia a foto anexa a
esta pérola Passos Coelho falou e não se riu. Ele não sabe que “A ignorância da
Lei não aproveita a ninguém”. Também há que tirar uma conclusão: Passos Coelho
afinal não está na vida pública… por que se estivesse preocupava-se em não dar
maus exemplos. Ou então, se está, porta-se como um descarado prevaricador que
faz tábua rasa das normas morais e éticas. Age como o frade que apregoava aos
fiéis: “atendam ao que digo, mas não olhem para aquilo que faço”.
Estupenda, esta pérola de Passos Coelho.
Segunda: “Eu ainda não sei hoje o que é exactamente o caso
Tecnoforma.”
Caramba! Como Passos Coelho se
revela ignorante. Ele não sabe e nunca vai saber com quantas tábuas se faz uma
canoa…
Pelo que evidencia e que,
implicitamente, confessa: Coelho está possuído de uma terrível incapacidade que
bastante o debilita e que se traduz na lentidão com que nele se processa a
compreensão das coisas e loisas da vida.
Eloquente, esta pérola de Passos Coelho.
Terceira: “As pessoas merecem ser tratadas com outro respeito e isso
faz parte da prudência governativa.” Será que Passos Coelho não se engasgou
ao pronunciar estas palavras? Ele que há quatro anos se ocupa diariamente em
faltar ao respeito a milhões de portugueses. Ou que espécie de (des)respeito
quer ele, nos próximos tempos, dispensar aos jovens, adultos, idosos,
funcionários públicos e reformados, deste país?
Anedótica, blasfema, cínica e despudorada,
esta pérola de Passos Coelho.
Quarta: “Iniciámos também um processo de melhorar a selecção e o
recrutamento dos dirigentes da administração pública. É preciso voltar a dar
credibilidade a estes processos de escolha.”
Veja-se só: Há pouco tempo iniciaram
o processo e já é preciso dar credibilidade a coisa que nunca a teve e que foi
instrumento de colocação das rapaziadas que assentaram despudoradamente à mesa
do ORÇAMENTO.
Magnífica, esta pérola de Passos Coelho.
Quinta: “Não creio que tenha perfil adequado à Presidência da
República.” Quem ousaria dizer um semelhante disparate?... Apetece exclamar:
Irra! Coelho. Você é mesmo de compreensão lenta. Então não percebe que tem o
adequado perfil. Ou não fosse você parte integrante dessa creditada estirpe
nacional em cujo seio se fabricam os presidentes da República e do Conselho de
Ministros, que temos como mercê do divino Supremo Arquitecto do Universo.
Mais: Se um cavaco algarvio
ascendeu a venerando chefe de Estado e um coelho transmontano, segundo consta,
aterrou de pára-quedas na presidência do Conselho de Ministros, por que não
Passos Coelho se instalar como inquilino presidencial no Palácio de Belém?
Abra os olhos Passos Coelho ou
deixe-se de lérias - que não convencem os argutos portugueses que ainda existem
nas margens do insólito oásis cavaquista, ora transformado no terrível pântano
citado noutra época pelo famoso Guterres - logo que recupere (se tal ocorrência
lhe for possível) as faculdades de compreensão.
E tenha presente um factor não
despiciendo: os seus dilectos amigos Miguel Relvas, Marco António e Dias
Loureiro, grandes e conceituados artistas do circo político, estão a postos e
preparados para lhe fazerem a cama presidencial.
Inacreditável, esta pérola de Passos Coelho.
Sexta: “(…) muitas vezes vimos o caso mal parado. E isso talvez
me tenha feito perder muito cabelo… Talvez esses meus nervos muito bem tratados
dentro de mim próprio me tenham custado o cabelo.” Neste ponto, ‘a letra
não condiz com a careta’. Pelo menos, a julgar pelas fotos, Passos Coelho não
denota falta de cabelo ou falhas na farta cabeleira.
No que concerne aos nervos de
Passos Coelho ficam inquietantes dúvidas: o que serão os nervos de Coelho muito
bem tratados? Ainda, por cima, (fantástica circunstância) dentro dele? E se,
por acaso, muito bem tratados fora dele, o que resultaria? E se mal tratados
fora dele? De qualquer modo, perversos
nervos causadores da queda do cabelo. Em todo o caso é intrigante que Passos
Coelho se tenha apercebido da perda do cabelo… e não tenha providenciado o mau
tratamento dos indisciplinados nervos ou mesmo a queda dos mesmos.
Despropositada, esta pérola de Passos Coelho.
Sétima: “(…) conseguimos diminuir o desemprego.” É verdade! Desta
vez, Coelho disse o óbvio! Mas diminuição da taxa de desemprego à custa de quê?
Sobretudo, da emigração de
muitíssimos milhares de jovens, dos milhares de adultos e de tantos
desempregados que desistiram de procurar emprego, de muitos trabalhadores que
se suicidaram ou de inúmeros cidadãos que foram morrendo abandonados ou sucumbindo
nos corredores dos hospitais, por carência de meios de subsistência e de
tratamentos médicos.
Configura-se como uma calamidade
o criminoso desperdício representado pela exportação graciosa da maior riqueza
nacional: a massa cinzenta qualificada do país.
Repugnante, esta pérola de Passos Coelho.
Oitava: “Sem um governo de maioria passaremos as passas do
Algarve”. Algo fantasiosa e presumida tal afirmação. A menos que seja lida
com a seguinte formatação: Sem um governo de maioria passaremos do Algarve, as
passas.
Então, perguntaremos: passarão do
Algarve (as passas) para onde? Para onde quer que seja, façam a mercê de não se
esquecerem de meter no embrulho o cavacal fruto seco de Boliqueime.
E por tão auspiciosa hipótese,
diremos:
Animadora, esta pérola de Passos Coelho.
Resumindo: A entrevista de Passos Coelho teve a utilidade de nos
mostrar, em todo o esplendor e tonalidade coelhal, a personalidade de um
político arrogante, autoconvencido, sem rumo definido em prol dos interesses da
grei.
Igualmente, demonstrada a sua
incapacidade, a falta de humildade e a falha de autocrítica, para admitir os
erros cometidos e deles se penitenciar perante os cidadãos portugueses.
Outrossim, evidenciadas a crónica
falta de conhecimento do país real e a provada inaptidão para apreender o
estado da nação portuguesa.
Também, de assinalar a falta de
visão política, de pensamento estruturado e coerente e a confrangedora ausência
de programa conducente à recuperação e desenvolvimento de Portugal.
Conclusão: Uma desenxabida entrevista que se enquadra, em época de
eleições, na campanha em curso de branqueamento da cinzenta imagem de Passos
Coelho. E, sob esta óptica, o semanário SOL veio dar o contributo de fraterna amizade
e de convergência ideológica dos membros do seu quadro directivo.
Uma lástima!
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