Despacho charadístico
Parte II
Brasilino Godinho
01.
A obsessão das comissões, dos observatórios e dos institutos.
O (Des)governo delira com a
criação de comissões, observatórios e institutos. E não só. Também se tem
empenhado em gerar necessidades de pareceres jurídicos que encaminha para
escritórios de advogados compinchas; seguindo escrupulosamente(…) a prática de
governos anteriores. Este é um procedimento despesista inadmissível nos actuais
tempos de profunda crie financeira do Estado.
A maioria das tarefas
atribuídas a tais organismos de nítida configuração tachista, poderia ser
desempenhada pelas direcções gerais dos ministérios, conforme, geralmente, se
fazia nos tempos da ditadura do Estado Novo (o que evidencia que, infelizmente,
na democracia à portuguesa, se fazem coisas muito abjectas e se tem ido longe
de mais por caminhos de desvergonha e de abuso descarado).
Aliás, dada a situação
de os gabinetes ministeriais estarem superlotados de especialistas e de
assessores bastante credenciados pela invulgar sabedoria dos seus mui verdes
anos, seria aconselhável que fossem eles a fazer os trabalhos que se estão
encaminhando para as novas centrais do tachismo oficial; quer por razões
económicas, quer de ocupação dos tempos de serviço que, se suspeita, sejam de
persistentes entretenimentos na elaboração de charadas.
Anote-se que congeminar
e elaborar charadas, mesmo com a chancela oficial, não será prática admissível
no seio de uma qualquer instituição do Estado. Pelos vistos, até o Conselho de
Ministros ocupa tempo na apreciação e na aprovação de tais peças.
Lamentável! E com a agravante
do despacho charadístico em causa, acarretar grandes despesas com a instalação
e funcionamento da Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD).
Este, um quadro
situacional dos ambientes ministeriais que até está evidenciado neste despacho
charadístico da ministra das Finanças. Mas, pior ainda, trata-se de mais uma
demonstração de insensatez política. Também de registar que
a senhora ministra eleva, para dois, o número de despachos charadísticos
assinaláveis no seu currículo ministerial – se não nos falha a memória.
02.
Matando a charada…
Comecemos por nos
situarmos nos dois planos em que é possível ‘matar a charada’ : enigma e
linguagem obscura.
O
primeiro parágrafo do despacho ministerial, que inserimos com algumas
colorações, está redigido em termos enigmáticos. Igualmente, formatado numa confusa
linguagem, algo obscura.
As
definições programáticas são muito vagas. Em tom jocoso até poderíamos dizer
que esplendidamente imprecisas.
Repare-se: “(…)
que tem como objectivos contribuir para a concretização das políticas públicas
de promoção do crescimento e emprego, (…).”
Perguntar-se-á:
-
Não são os órgãos do Governo que devem prosseguir esses objectivos? O que são
essas políticas públicas de promoção do crescimento e emprego?
-
O que será e como se medirá para o credibilizar esse visado “desenvolvimento inteligente”? E “sustentável”? Por quem? Ou como?
E
mais extraordinário o tal desenvolvimento (imagine-se!) será “inclusivo”… Onde? E como se incluirá?
-
Para “melhorar as condições de
financiamento da economia”? Com que arte? E à revelia do respectivo
ministério? Qual o papel do ministro da Economia nesse hipotético desenrascanço
autónomo do novo instituto?
-
“Aperfeiçoar a arquitectura dos
instrumentos financeiros, através do aumento de eficácia dos instrumentos de
financiamento”? Que embrulhada de se lhe tirar o chapéu… O que se quer
dizer, afinal? Dá a ideia de uma pescadinha com o rabo na boca… Aperfeiçoa-se a
arquitectura dos instrumentos através do aumento da eficácia dos mesmos? Ou
aumenta-se a eficácia dos instrumentos através do aperfeiçoamento da
arquitectura dos ditos? Como deslindar o aperfeiçoamento da arquitectura e o
aumento da eficácia? Haverá uma incompatibilidade escondida entre uma coisa e
outra? Mistério… no ministério.
-
E, expressão intrigante: “(…) realização plena dos princípios da boa
governação”.
O
que se poderá entender como realização plena de uma boa governação do (Des)governo que temos?
Pertinente
a dúvida, porquanto todos sabemos quão desastrosa e maléfica tem sido esta
governação para a sociedade portuguesa.
E
se a rapaziada governamental nos aponta uma sua boa governação, certamente que
nos estão a ameaçar com mais desgraças para o sacrificado povo português.
Vade retro Satana!
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