BRASILINO GODINHO
204. APONTAMENTO
19 de Março de 2019
204. APONTAMENTO
19 de Março de 2019
DESDE JOVEM
ENVOLVIDO EM LUTAS CONTRA TABUS
(Continuação do 203. APONTAMENTO)
QUARTO TABU
Concluído em 1947 o curso secundário (Industrial
de Serralharia Mecânica), na Escola Jácome Ratton, de Tomar, de imediato
iniciei um pequeno curso de explicações de matérias incluídas no programa do
exame de admissão ao Instituto Industrial de Lisboa; com vista a prosseguir
estudos orientados para a frequência do Instituto Superior Técnico.
Para os estudantes que provinham das
escolas industriais, do Ensino Secundário, o exame de admissão ao Instituto
Industrial era condição imprescindível para ingressarem no Instituto Industrial
e obterem o diploma de Agente Técnico de Engenharia. Para quem pretendia seguir
para o Instituto Superior Técnico e alcançar o grau de Engenheiro, tinha que
frequentar os dois primeiros anos do Instituto Industrial com aproveitamento e
assim ficar habilitado a transferir-se para o primeiro ano do curso de
Engenharia do Instituto Superior Técnico.
Os estudantes liceais, findo o
respectivo curso transitavam directamente para o Instituto Superior Técnico e
para todos os estabelecimento do Ensino Superior.
Terminado o pequeno ciclo de
explicações, suficiente para quem obtivera boas ou razoáveis classificações,
dado que era de bom nível o curso ministrado na Escola Industrial e Comercial
Jácome Ratton, chegara a altura de obter o patrocínio de alguém para me
financiar o prosseguimento da aprendizagem escolar num superior patamar.
Logo me surgiu a ideia de solicitar o
financiamento a um familiar que tivesse condições financeiras para me facultar
a necessária alavanca de apoio para consumar o meu propósito.
Naturalmente e sem delongas, a pessoa
do meu avô paterno, Manuel Godinho, industrial de cantarias e fornecedor
exclusivo, em tempo de decorrente II Grande Guerra, de lenha e carvão para a
importante Fábrica de Papel do Prado e Fábrica de Papel de Marianaia, da
Companhia do Papel do Prado, se me afigurou ser o anjo protector sob cujos asas
me poderia acolher.
Então, numa tarde, confiante no avô,
meu padrinho de baptismo, que me deu o nome de Brasilino em homenagem a um
amigo dedicado que tivera na região de São José dos Campos, Estado de São
Paulo, Brasil, dirigi-me ao escritório-sede dos negócios do avô, pedi licença
para entrar (por dever de educação e por ele ser dado a todos os formalismos de
relacionamento fosse com quem fosse) cumprimentei-o, ao que ele, sentado junto
ao estirador onde projectava os artísticos jazigos que fabricava, correspondeu
como se desse uma ordem: senta-te!
De imediato, olhando-me de frente,
interpela-me: “o que te traz por cá?” O neto Brasilino, algo temeroso (a
figura, o olhar penetrante, a voz grossa, o distanciamento no diálogo ou na
aproximação e, nalgumas ocasiões, gestos bruscos, impunham profundo respeito a
qualquer pessoa e aos familiares) disse-lhe: “avô desejaria continuar a estudar
e ir para o Instituto Superior Técnico de Lisboa, para tirar o curso de
Engenharia. Peço-lhe ajuda financeira.” Silêncio! Não se ouvia o esvoaçar de
uma mosca. Pausa de uns minutos como se estivesse a olhar no vácuo, que me
pareceu uma eternidade muito enervante. Após que, calmo, me dirige o seguinte
comentário: “isso custa muito dinheiro!” Nova aterradora pausa. Até que volta à
carga. Diz-me, em tom displicente: “Mas se tu quiseres, compro-te uma bicicleta
e vens para o escritório ou oficina da fábrica.” Minha reacção, decidida,
fulminante: “isso, não!”
“Boa tarde avô.” Regressei à casa de
onde partira: a de meu avô, na aldeia da Pedreira, sobranceira ao lugar do
Prado, que dista 5 km. da cidade tomarense. Já na companhia da minha avó
paterna Custódia e tias Emília e Maria, desabafei minha desilusão. Não me deram
qualquer apoio moral. Pelo contrário, mais acentuaram a minha frustração e
tristeza. Limitaram-se a comentar que o avô não precisara de ultrapassar a
instrução primária para aos 18 anos já chefiar uma equipa de trabalhadores e
para conseguir o sucesso que ia tendo nas suas actividades industriais. Pior a
emenda que o soneto…
Nunca mais, no seio da família, se
trocaram palavras sobre tal dramática ocorrência.
Facilmente se imagina o drama vivido
pelo jovem Brasilino Godinho.
No entanto, devo anotar que durante dezenas
de anos condenei intimamente a negativa do meu avô paterno. Mas nesta última
década operou-se no meu espírito uma significativa transposição na forma de
encarar o que aconteceu e hoje é a visão e objectividade expendidas e os
sucessos alcançados ao longo da minha dilatada existência, que se me deparam
com grande satisfação; afinal, eles foram conseguidos por ter sido gorada a ida
para o Instituto. Agora reafirmo o que tenho dito aos jornais, revistas, rádios
e televisões, em 2012,2013, 2017 e 2018, estou profundamente agradecido ao meu
avô, celebro a sua memória, porque, afinal, com a sua recusa, assegurou as
condições de aos 77anos de idade ter sido caloiro universitário e alcançado
pelo próprio esforço, entre fins de 2008 e 2016 os dois cursos: Licenciatura em
Línguas, Literaturas e Culturas e de Doutoramento em Estudos Culturais, sem
recorrer a equivalências e a quaisquer expedientes muito em voga nalgumas
universidades que bem deveríamos considerar de vãos de escadas, localizadas no
Bairro Alto de Lisboa.
Há males que vêm por bem! Felizmente
assim aconteceu com o cidadão Brasilino Godinho.
Fotos:
Brasilino
Godinho entrevistado por jornalistas de periódicos (jornais e revistas), rádios,
e televisões nacionais e da TV RECORD EUROPA, no final do seu Acto de
Doutoramento, efectuado a 05 de Julho de 2017, na Universidade de Aveiro.
Simples
conferência de imprensa que se constituiu como acto de consagração de um longo
percurso de existência e de um curto trajecto de vida universitária de
Brasilino Godinho, iniciado a 20 de Outubro de 2008, na condição de caloiro,
aos 77 anos de idade.
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