Em
tempo de compasso…
UMA
VEZ MAIS, A CRIATURA
CHEGA
ATRASADA E MELÍFLUA…
Brasilino Godinho
O advogado, Dr. Jorge Sampaio,
ex-presidente da República, por um instante de confusa inspiração ou de
abstrusa especulação intelectual, sentindo-se (quiçá) no incómodo papel de
juiz, veio hoje à barra do tribunal da opinião pública, ditar a sua sentença sobre a situação do país.
Chega um pouco tarde. Utiliza uma
linguagem melíflua. E lança mão, mais uma vez, de um expediente activo e de um
recurso linguístico que lhe são habituais na sua postura em sociedade.
Assim o causídico se exprimiu:
- 01. “A austeridade rebenta com o país, com os
portugueses e a sua esperança, com os direitos e até com a própria democracia”.
Ora vejamos e analisemos alguns aspectos
nebulosos da fala do político Jorge Sampaio.
Em primeiro lugar, a austeridade não
rebenta com o país pela simples razão que Portugal já está rebentado e até
dominado sob tutela dos mercados internacionais e de outras instituições
estrangeiras, configurando um quadro de subserviência total a que o declarante
não será inteiramente alheio ou que dele nem tenha plena consciência.
Em segundo lugar, nem é só a austeridade
que aniquila o país. Há muito tempo, com três dezenas de anos de decorrência
que bastantes políticos incompetentes, oportunistas e demagogos, vinham, displicentemente,
percorrendo o tortuoso caminho que nos conduziu ao colapso em que nos
encontramos.
Em terceiro lugar, os portugueses também
já estão “rebentados” e muitos deles encontram-se nas numerosas filas de espera
dos transportes funerários que os conduzirão aos prados do repouso eterno.
Claro que a esperança de uma qualquer recuperação lhes está inacessível,
porquanto se encontram em fase terminal de uma existência, ora por demais
avassaladora e dolorosa.
Falar de direitos “rebentados”
obviamente que parece deslocado e com sabor amargo de brincadeira de mau gosto,
face ao quase total desprezo pelos princípios consagrados na respectiva carta
universal e por aqueloutros que constam do articulado da Constituição da
República Portuguesa, que Deus haja em remoto e ignoto sítio; um acentuado
desprezo de que temos diárias provas factuais.
Sobre o “rebentamento da democracia” há
que afirmar esta verdade comezinha: ele começou a partir do restauro do regime,
dito democrático, em 25 de Abril de 1974. Logo, nessa época, se há notado que a
Democracia estava desprotegida e completamente à mercê de gente incapaz,
impreparada, sem fervoroso apego aos princípios reguladores da cidadania e,
também, de todo, desprovida de inequívoca fidelidade aos valores da Liberdade, da
Igualdade e da Fraternidade; os quais, na era moderna, são correlativos à
regular funcionalidade da DEMOCRACIA.
DEMOCRACIA que, queiram ou não, deverá
ser sempre o governo do povo, pelo povo e para o povo.
E no decorrer dos tempos foi-se notando
a degradação da Democracia o que, indubitavelmente, se deve às nefastas
actividades políticas e governativas levadas à prática por parte de gente
desqualificada e incompetente, que atendeu mais aos múltiplos e obscuros
interesses pessoais, partidários e de vários e indiferenciados grupos com
elevada preponderância: quer na sociedade portuguesa, quer no vasto sector
internacional.
- 02. “A democracia tem que responder com ideias, com
aberturas democráticas”.
Esta frase é daquelas expressões
ambíguas a que o ex-presidente Sampaio recorre frequentemente. Mais parece uma
charada.
Desde logo, porque a democracia é,
afinal, a nação democrática - seja ela (democracia) directa ou representativa.
Como parte integrante indissociável da
nação, a democracia é uma entidade abstracta que, por definição, representa um conjunto
de indivíduos que constituem uma sociedade e se submetem a um estilo e normas
de vida política e de práticas administrativas orientadas no sentido do bem
comum. Ou seja: a democracia consagra a política como arte ou ciência de bem
gerir a república dos cidadãos, configurando-se num corpo social regido por
leis próprias, subordinado a um poder central.
Portanto, não é a democracia que
responde a qualquer solicitação seja ela abstracta ou de ordem prática
formulada por quem quer que seja ou correspondendo a necessidades evidentes da
comunidade. Pela razão de que são os agentes operacionais investidos nos
exercícios do poder democrático que darão o conteúdo e a forma de agir
correspondentes a necessidades vitais dos cidadãos em particular e da
comunidade em âmbito geral. E aqui se centra o ponto essencial que aparece
iludido na fala de Jorge Sampaio. Isso acontece por ser manifesta a intenção de
desculpabilizar os agentes políticos, como se não fossem estes os fautores das
desgraças acumuladas e decorrentes das perversas orientações e medidas
políticas executadas pelos referidos protagonistas do nosso drama colectivo.
Apontamos uma pertinente sugestão: haja
alguém que explique essa ideia sampaísta de que a democracia tem que responder com aberturas partidárias.
Então os partidos, que são partes
integrantes da democracia, esperam que a democracia lhes responda com aberturas
partidárias? E quais são as interpelações e os respectivos autores que obrigam
a democracia a responder com as ditas aberturas? E que órgãos ou entidades
agindo em nome dela “respondem (a quê? e a quem?) com aberturas partidárias”? Assim
invadindo o território partidário e sobrepondo-se à autonomia funcional dos
partidos.
Se há que fazer aberturas – seja lá isso
o que for ou aquilo que se possa imaginar – não serão os partidos que, por
iniciativa própria ou por concertação com outros parceiros, se entregarão a
essa tarefa?
Aqui bem evidente o tipo de linguagem
confusa e inconsistente do ex-presidente da República, Jorge Sampaio.
Fim
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