Estimadas senhoras,
Caros
senhores,
Meus
atenciosos leitores,
Tomo a iniciativa – porque vem à colação - de vos apresentar uma minha crónica publicada neste blogue em 20 de Junho de 2006. Tem a particularidade de, numa primeira reacção à leitura, julgarem que ela terá sido escrita agora, tal é a sua plena actualidade.
Penso que a
mesma dá que pensar. E faculta ao leitor atento a possibilidade de avaliar quão
dramática tem sido, nos últimos seis anos, a negativa evolução da política
portuguesa.
Com os melhores cumprimentos.
Brasilino
Godinho
Terça-feira, Junho 20, 2006
PARA
QUÊ?
PARA
COMEMORAR O SUCESSO…
DO
INSUCESSO GOVERNAMENTAL.
Brasilino Godinho
http://quintalusitana.blogspot.com
01. No p.p.
dia 10 de Junho, o Presidente da República fez um discurso à Nação. Aproveitou
a circunstância para dirigir aos portugueses quatro apelos:
Primeiro: “Não
se resignem face às dificuldades”.
Segundo: “Aprendam
com a insatisfação colectiva”.
Terceiro: “Arranjem
coragem para enfrentar dificuldades”.
Quarto: “Não
se deixem vencer pelo desânimo ou pelo cepticismo”.
02. Antes, a
26 de Maio transacto, no “FÓRUM PARA A COMPETITIVIDADE”, o conhecido gestor
americano Jack Welch dissera:
a) – “As pessoas
são demasiado estáticas em Portugal”.
b) – “Os
portugueses deveriam ter vergonha da degradação do País”.
c) – “É
humilhante para os portugueses a percepção que o exterior tem de Portugal, que
é de uma contínua degradação e declínio ao longo dos últimos anos”.
d) – “Cortem as
ervas daninhas e terão um bonito jardim”.
e) – “Os gestores
que apenas gostam de números e que não querem saber de pessoas - mas elas
existem na empresa - são uns idiotas”.
03. Desde
anos mais recuados, Brasilino Godinho vem escrevendo sobre o famigerado plano
inclinado do nosso desvario colectivo. Ainda, há pouco, na sua obra ”A QUINTA LUSITANA”, escreveu a página
76: “Neste país, de gente amordaçada pelo sistema hermético da
partidocracia, de cidadãos confundidos pelos fingimentos dos “políticos” e de
pessoas molestadas pela inaptidão ou má fé de governantes irresponsáveis, tem
faltado o tempo, não houve espaço, não existiu o bom ambiente, nem surgiram os
estadistas capazes, para se afirmarem os valores dos princípios, as mais-valias
das competências, as riquezas dos saberes e as supremas autoridades das experiências
acumuladas”.
04. António
Oliveira Salazar, sempre ele, o grande mestre (pedreiro-livre? ou
pedreiro-cativo?) das tiradas grandiloquentes, a baralhar-nos o juízo, depois
de nos atirar à cara “que a vontade de
obedecer é a única escola para aprender a mandar” e sem nos ter dado
conhecimento se teria exercitado regras e devoção de obediência, induzia os
sequazes a perguntarem ao pagode: “Quem
manda”? E logo, os mesmos, sem darem tempo aos indígenas de respirar fundo,
apressavam-se a responder desabridamente: Salazar! Salazar! Salazar! (Em dose
tripla para desfazer hipotéticas dúvidas…). Pois foi este homem que um dia
disse que “a Agricultura é a arte de
empobrecer alegremente”. E providenciou, resolutamente, nesse sentido.
Instigou a malta a cavar a terra, a comer o pão que o diabo amassou e, nos
intervalos, a divertir-se com Fátima, Fado e Futebol. Foi uma santa alegria que
deu naquilo que todos sabemos e de que ainda hoje sofremos as sequelas.
Parafraseando
a “máxima” do chefe do Estado Novo (este, concebido e institucionalizado
segundo o modelo do regime fascista de Itália, criado por Benito Mussolini em
1922, três anos após a fundação do Partido Fascista e logo rematando a Marcha
dos Camisas Negras sobre Roma), diremos que, actualmente, a política, em Portugal,
é a arte de enriquecermos de amarguras. Tristemente. Resignadamente.
Barafustando, persistentemente, em surdina e com regularizada acomodação.
Vindimando numa vinha com muita parra e pouquíssima uva.
Mas se bem
considerarmos a bondade do contraditório e a importância dos dualismos que nos
condicionam o viver quotidiano, inevitavelmente daremos a chamada volta por
cima; ou seja: iremos encarar, com outro espírito, o quadro existencial da
sociedade portuguesa.
E nada
melhor para nos orientar nesta análise do que seguirmos a linha de pensamento
expressa pelo Chefe do Estado e as apreciações críticas de Jack Welch acima
reproduzidas.
05. De
facto, os portugueses (na sua maioria) sofrem, queixam-se e estão desanimados.
Em contraposição, entidades como os bancos, algumas empresas, grandes
capitalistas e magníficos empresários, atravessam um período de enorme
prosperidade. Mal dos primeiros. Bem super-requintado dos últimos. É verdade
que fecham fábricas quase todos os meses e milhares de famílias ficam na
miséria sem sustento. Igualmente, os serviços dos hospitais, das maternidades,
das escolas, das cadeias, são encerrados. Está a definhar e a encerrar tudo
aquilo de instituições e meios da organização social que o pagode necessita
para satisfazer necessidades básicas para levar por diante uma vida regular e
decente. Porém… atenção!
Um olhar
mais atento descortinará que se muitas responsabilidades cabem ao governo,
alguns reparos têm de ser dirigidos à malta…
Alguém já se
deu ao cuidado de pensar nos esforços dos governantes quando nada fazem de
concreto ou de útil e nos aborrecimentos e transtornos que padecem naquelas
frequentes ocasiões que agem mal e porcamente? Dá-nos um arrepio na espinha só
de imaginar o cansaço físico e o desgaste psicológico que, por causa dessas
atribulações e desventuras, se apodera irremediavelmente das excelências.
Depois, os cidadãos mais desfavorecidos estão mal habituados quanto às lamúrias…
É nas dificuldades que se fortalece a alma. E não só do pão vive o espírito do
homem. Também se pode dizer que nem só do espírito se alimentam os ricos homens
e as belas mulheres. Se uns carecem de pão para a boca; outros tendo o pão
precisam da boca e de olhos convenientemente tratados… a completar a
enriquecida alma. Que imensidão de preocupações não atingem os ricaços machos e
as esplêndidas fêmeas, a qualquer momento perspectivando assaltos aos seus
bens. Também, inquietos, sobrecarregados de dúvidas quanto às aplicações
financeiras. Quem há por aí que não tenha ouvido o desabafo de ilustre
milionário: “Ó como os pobres são felizes
por não terem problemas de defesa e (ou) aplicação dos bens materiais!”...
Sem dúvida: o vil metal a atormentar o povo, a nobreza e o clero. Ontem, hoje,
amanhã…
06. Depois,
Jack Welch não tem razão. Os portugueses estão desde a época dos descobrimentos
habituados a percorrer declives de afundamento das condições de vida e já não
têm vergonha disso. Como dizia o Salazar – e lá vem ele outra vez à baila… –
estamos orgulhosamente sós; no primeiro lugar dos últimos da Comunidade
Europeia. Já é alguma coisa… Quanto a cortar ervas daninhas e termos um bonito
jardim já nos basta ter o canastrão do Jardim da Madeira. Ufa!...
Mais um
apontamento sobre o Welch. Este amigo da onça não é nada perspicaz ao falar de
números e de pessoas das empresas portuguesas. Francamente, chamar idiotas aos
nossos empresários não lembrava ao Diabo. E logo àqueles espertalhaços que
sabem das pessoas mas apenas gostam dos números… e de contemplar o próprio
umbigo. Onde se viu um inteligente empresário apresentar-se numa venda de
melões a comprar os ditos com uma pessoa. Não é com os números (de notas,
claro!) que se compram os melões e… outras coisas mais?
07. Caramba!
Todo este palavreado para chegar a esta conclusão: Vamos de mal a pior, segundo
o sentir de muitos cidadãos. Estamos nas sete quintas na opinião de alguns
excelentes reformados, imponentes gestores, majestosos capitalistas.
E está quase
tudo a encerrar. Certo! Todavia, estranhamente, ninguém se lembrou de meter em
clausura o Governo.
Tome nota
presidente Cavaco Silva: porque “não nos
resignamos”; porque “aprendemos com a
insatisfação colectiva”; porque não necessitamos “arranjar coragem”; porque não vamos sucumbir arrastados “pelo desânimo e pelo cepticismo” – TODOS, VAMOS CRIAR O “DIA NACIONAL DO
GOVERNO”.
Para, no mínimo - e pelo menos por um dia - nos
livrarmos dele. E durante 24 horas recuperarmos o fôlego. Igualmente,
festejarmos o sucesso… do insucesso governamental.
Tal como num dia sem automóveis nas cidades, hajam
festas, missas de acção de graças, bailes de máscaras (e temos imensas na área
política), encontros de namorados, cortejos, fanfarras, celebrações de teatro
revisteiro, provas desportivas e… debates sobre o estado em que estamos, com
especial incidência nas trapalhadas contempladas no circo político. Tudo
apresentado com entusiasmo e alegria. Ah! Em Lisboa, no Terreiro do Paço, não
esqueçam de fazer uma grande manifestação ordeira, civilizada, com muitos
discursos de elogio ao insucesso do Governo. Ele merece! Aliás, seguindo o
exemplo dos que o antecederam.
Sobretudo, lembrem-se: Tristezas não pagam dívidas… E,
nossas, muito sofridas, nem põem a governar bem quantos - mal governando - bem
se governam…
08. No “DIA NACIONAL DO GOVERNO”, POBRETES, MAS
ALEGRETES, GRITEMOS: VIVA A FOLIA!!!
Apelo aos portugueses:
- Demo-nos as mãos e as vontades.
- Vamos dar uma forcinha para que esta generosa ideia
posta na contemplação dos nossos queridos e sacrificados governantes e mui
reconfortante da nossa auto-estima, se concretize a breve prazo. Ela é do maior
interesse político-social…
Sempre em Portugal se falou mal dos presidentes, dos
ministros, dos políticos, dos administradores. É tempo de, publicamente e com
pompa e circunstância, se reconhecer os méritos das desgovernações, das
incompetências, dos desleixos, dos abusos, das falcatruas, dos oportunismos.
Outrossim, se abrir uma brecha nesse deprimente estado de abatimento colectivo
que tanto dificulta o exercício da boa vontade e a expressão das faculdades de
alma dos detentores do Poder…
E acontece que nunca em Portugal se festejou com
relevo o fracasso dos governos.
Portanto e porque os portugueses sabem ser agradecidos
para quem os trata com tanto desvelo e carinho… está na hora de, a título
excepcional, festejarmos o sucesso do insucesso das governanças.
É agora!!!
Passem
palavra! A Bem do Zé-Povinho!...
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