NESTE DIA,
há 5 anos,
QUÃO ASSERTIVA FOI A
CRÓNICA
A COMPONENTE MAQUIAVÉLICA
DA CERTEIRA RAZÃO DE MARCELO
Em finais de 2003, quando escrevia a página 26 da obra A QUINTA LUSITANA, estive tentado a aludir ao que me parecia ser a componente maquiavélica das sucessivas contradições de Marcelo Rebelo de Sousa, inclusas nas atitudes que ia tomando sobre o político, seu correligionário, Aníbal Cavaco Silva.
Não concretizei o intento para não ser acusado de exagerado e fantasista. Decidi esperar pela passagem dos anos, sempre convencido de que haveria de chegar a altura para, imitando a criança do conto de Andersen, vir a terreiro dizer que o rei vai nu.
Hoje e após o inqualificável e verrinoso discurso à nação do presidente Cavaco Silva, é a altura de abordar o assunto.
E porque citei o discurso de Cavaco Silva anoto que três candidatos à Presidência da República (Sampaio da Nóvoa, Henrique Neto e Maria de Belém) já se pronunciaram publicamente, em termos muito condenatórios, sobre tal destrambelhada e insensata peça discursiva de um presidente que, na circunstância, renegou os deveres básicos, constitucionais, do seu elevado cargo presidencial.
Isto aconteceu enquanto Marcelo Rebelo de Sousa - já titulado detentor da função presidencial, por inusitada mercê do “Partido da Comunicação Anti-Social” - tem mantido um comprometedor silêncio; o qual, repercute ruidosamente pelas urbanas cidades e pelas quebradas mais remotas do território nacional. O que não sucede por acaso!
É que se Cavaco Silva tem sido tão inepto, como ontem evidenciou de forma clamorosa, isso representa a confirmação das fraquezas há muito detectadas na criatura pelo seu companheiro de partido: Marcelo Rebelo de Sousa. Certamente que tendo isso bem presente, o candidato/presidente Marcelo tem todo o interesse que não lhe seja apontada a condição que ora aqui expresso: a de ele ter sido o esforçado criador do personagem Aníbal Cavaco Silva.
Primeiro, no casino da Figueira da Foz onde nos bastidores manobrou no sentido de ele ser escolhido para chefe do Partido Social Democrático (PSD). Logo a seguir, deu as suas forcinhas para Cavaco chegar a primeiro-ministro.
Anos depois, atacou-o sem dó, nem piedade, afiançando que “a incultura de Cavaco Silva, política e não só, é abismal – e o seu triunfo foi o da vulgaridade”. E não contente com o tom de veemência da avaliação, Marcelo acrescentou: “Vejam lá se alguém teve a coragem de dizer isto”.
Decorridos mais alguns anos, aquela coragem marcelina foi travestida por outra coragem típica de um catavento Marcelo que gira ao sabor do vento. Qual coragem foi esta? A de promover a candidatura de Cavaco Silva à Presidência da República com os resultados que se têm registado, inerentes “à incultura abismal, política e não só” que lhe assentara como uma luva. Luva que o presidente de cavacal formatação jamais conseguiu descalçar.
Enquanto há vigorado a permanência de Cavaco Silva no Palácio de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa tem desenvolvido uma persistente actividade de apoiante e de prudente crítico. Ora dá uma no cravo e outra na ferradura, que doseia com alfinetadas corrosivas muito subtis que, geralmente, nem são apercebidas pelos telespectadores das suas conversas domingueiras nos canais televisivos.
Sintetizando: Marcelo Rebelo de Sousa criou, desenvolveu e acompanhou mais ou menos modelando, a narrativa cavaquista. Melhor explicitando: Cavaco Silva é um personagem e um mito gerado e mantido na ribalta pelo espírito criativo de Marcelo Rebelo de Sousa. Por isso, Marcelo é um grande responsável pelo inaceitável exercício do presidente Cavaco Silva.
Perguntar-se-á: Qual o interesse de Marcelo nessa produção cavaquista.
Aqui comporta a minha interpretação que remonta a algumas décadas. Marcelo terá concebido Cavaco como uma lebre ideal que, futuramente, o levaria até ao Palácio de Belém. Como assim?
Pela simples e natural decorrência da cavacal figura ser tão destituída intelectualmente que, decerto, os seus desempenhos na Presidência da República se anteviam como mui desastrosos. Assim sucedendo, e feitas inevitáveis comparações de personalidades e respectivos atributos intelectuais, Marcelo ficaria em excelente situação de se propor ao PSD como seu representante e candidato ao lugar presidencial.
Dito em termos simples: primeiro, avançava o inepto, Cavaco, a abrir caminho para o apto, Marcelo (estrela cintilante, sempre exposta nas pantalhas televisivas). Ou exprimindo de outra forma: ‘o primeiro milho é dos pardais; o segundo milho é para quem der mais’.
Afinal, algo substantivo que releva de um engenhoso e maquiavélico propósito de Marcelo Rebelo de Sousa. Propósito que tem sido superiormente prosseguido discretamente, sem alarde público ou embaraçosa percepção dos portugueses que, nas noites dos domingos, o viam e ouviam nas televisões.
Ele, Marcelo Rebelo de Sousa, aí está na pista presidencial e a fazer eloquente demonstração de quanto é assertiva a presente avaliação do cronista Brasilino Godinho.
Marcelo, gozão, proclamará: Sou um sortudo! Até lhe digo, não é só uma lebre.
São duas: Cavaco, o algarvio situacionista e Maria, a de Belém, do reviralho…
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