460. Apontamento
Brasilino Godinho
23/Julho/2020
DE UNIVERSIDADES
PARA
AGÊNCIAS DE ENSINO SUPERIOR
Parte I
01. As universidades têm séculos de existência e de
muitíssima utilidade. Em todo o mundo e em Portugal.
Nestas décadas do século XXI, em Portugal vem-se
discutindo bastante o papel central da Universidade na sociedade.
E quando se aborda a temática desde logo ela fica
algo inquinada pela razão induzida de a correlacionar quase que exclusivamente
no contexto das Ciências e passando ao lado das Humanidades que foram sempre a
imagem de marca das Universidades.
Na hora actual descartar as Humanidades e as Ciências
Sociais da instituição Universidade é desvirtuar-lhe o sentido universal de um
todo existencial concernente ao ser humano nos mais díspares domínios tidos
como essenciais e sejam:
saber/conhecimento, social, político, intelectual e artístico.
Mas também inviabilizar a formação humanista das
novas gerações com implicações graves no futuro da sociedade portuguesa; de que
já vamos tendo demonstrações pungentes.
No horizonte que se enxerga na actualidade despontam
robots humanos concebidos para os exercícios profissionais mas desprovidos de alma, de coração e sem visão
ou discernimento para verem um palmo à frente do nariz.
Bem ponderada a questão porque redutora na sua
inicial proposição e sem forçar muito a nota há que admitir ser ela compaginada
com uma mais ou menos subtil desvalorização da Universidade em Portugal.
O que não surpreende se tivermos em conta que a
desvalorização da instituição Universidade arrancou com a absurda aceitação das
universidades seniores, universidades de verão e das universidades tipo vão-de-escada
que vêm distribuindo licenciaturas arrelvadas, socráticas e felicianas – sem
manifesta repulsa da Universidade de Portugal.
Daí que se imponham medidas que, pela sua eficaz aplicação,
traduzam a reabilitação do Ensino Superior e a ele lhe devolvam o merecimento
público e a recuperação do estatuto e prestígio em más horas perdidos ou
gratuitamente adulterados.
02. Se isso é uma premente exigência que partilho com
a maior intensidade, a mui contragosto e bastante penosamente, custa-me aceitar
a ideia de uma revolução nos processos de ensino e numa modificação radical
“nos modelos formativos mais flexíveis que o tradicional curso/diploma.”
Sinto apreensão quando se fala numa “tendência
crescente para percursos formativos personalizados, de curta duração, marcados pela
interdisciplinaridade que caracteriza os desafios de hoje. Por outro lado, a
globalização e internacionalização crescentes impõem-nos a necessidade de
darmos resposta em qualquer país, sem prejuízo para o estudante.”
Esta transcrição inserida no parágrafo antecedente é
de texto do Magnífico Reitor da Universidade de Aveiro, publicada no JN; a qual
é feita com a devida vénia a Sua Excelência.
Sobre ela coloco foco nas seguintes expressões:
“tendência crescente”, “desafios de hoje”, “darmos resposta em qualquer país,
sem prejuízo para o estudante.”
Interrogo-me sobre a caracterização de percursos
formativos personalizados, de curta duração, com que aprofundamento de
aprendizagem e que, eventualmente, porque individualizados, serão bastantes,
diversos e marcados pela interdisciplinaridade satisfazendo - com que
assertividade? - os desafios de hoje; o que pressupõe deles haver conhecimento
circunstanciado e a compaginarem-se com a necessidade de resposta em qualquer
país.
Como portugueses, interessados na necessidade de
qualquer país? Que trabalho de pesquiza a desenvolver para apurar essas
necessidades? Não será mais de considerar as respostas às necessidades de
Portugal? Porquê em Portugal prosseguir a formação superior de jovens
encaminhados para o estrangeiro e este propósito ser mesmo traduzido em letra
de forma? Países estrangeiros que passam a beneficiar de profissionais
competentes a título gratuito sem terem gasto qualquer verba monetária. O País, muito endividado, pode dar-se a esse
caríssimo luxo?
Afigura-se-me intrigante a expressão “sem prejuízo
para o estudante.” Pois subentende-se que até agora o Ensino teria sido
ministrado com prejuízo para o estudante.
Pela parte que me diz respeito, estudante octogenário
que fui, entre os anos lectivos 2008/2009 e 2016/2017, cursando Licenciatura e
Doutoramento, respectivamente nas Universidades de Aveiro e do Minho, posso testemunhar
que não tive qualquer prejuízo. Pelo contrário, obtive enriquecimentos de
saberes e muitos outros de vivência académica muito gratificantes.
Também estou convencido que, ao longo do tempo,
muitos estudantes – de sucessivas gerações - do Ensino Superior obtiveram
vantagens e alcançaram sucessos mesmo em países estrangeiros, onde lhes tem
sido reconhecido mérito e é enaltecida a excelência da qualidade da
Universidade de Portugal.
03. Receio que se esteja programando a transformação
das universidades em unidades que designaria como AGÊNCIAS DE ENSINO SUPERIOR.
Até de promoção de turismo lectivo/científico,
disfarçado de intercâmbio ERASMO, porventura?
(Continua na
Parte II)
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