A
discursata de fim-de-ano 2014
do
venerando chefe do Estado...
Brasilino
Godinho
No p.p.
dia 31 de Dezembro de 2014 o venerando chefe do Estado falou para o
seu país; por sinal, ostensivamente circundante da restrita zona
que abrange os palácios de Belém e de S. Bento, localizados na
capital alfacinha.
Sua
veneranda criatura pronunciou uma discursata que, lançada no éter,
teve duas particularidades: em primeiro lugar e com efeitos
imediatos, poluiu a atmosfera, sobremodo afectando o meio ambiente
político/social; em segundo lugar, não foi direccionada à nação
dos indígenas.
E porque
o venerando chefe do Estado ignorou a existência das várias crises
que dilaceram a nação portuguesa e nem sequer referiu as
deploráveis condições de vida impostas pelo governo à maioria do
povo, passando ao lado dos escândalos financeiros que abalaram a
Banca e que enormes transtornos causaram à Economia; caiu sobre ele
o Carmo e a Trindade.
Daí, que
nós estejamos propensos a admitir que presidente Cavaco e mais os
seus colaboradores imediatos que ostentam o pomposo título de
governantes, afinal, estão condicionados nas suas práticas de
omissão e de voluntariosos erros e excessos da desgovernação em
curso pela simples razão dos problemas e casos de situações esquisitas não serem do
conhecimento oficial e só deles as excelências detentoras do Poder
terem vagas ideias de existência advindas do chamado “não
conhecimento oficial”.
E desta
elementar condição adversa que tanto desobriga as criaturas
governamentais e a presidencial figura, não se aperceberam os
críticos que, desde 31 de Dezembro p.p. vêm desancando sem dó nem
piedade o tristonho inquilino do Palácio de Belém.
Atendendo
a tal lacuna e lembrando-nos de que em 22 de Agosto de 2006, em plena
era governamental do eng. José Sócrates, escrevemos uma crónica em
que chamávamos a atenção dos portugueses para o soberano
desconhecimento oficial que, como mal infeccioso, contaminou as
cabeças dos governantes; hemos por bem republicá-la nesta data. O
que fazemos para reavivar a memória de bastante gente que anda por
aí desvairada ou distraída. Outrossim, embriagada pela propaganda
dos arautos do oásis coelhal/cavaquista onde viceja a famigerada
austeridade da nossa desventura colectiva.
Terça-feira, Agosto 22, 2006
É
ISSO! FALTA-LHES O CONHECIMENTO OFICIAL…
Brasilino Godinho
1
– As duras realidades do
Estado e da Nação são conhecidas, muito mal suportadas e bastante
sofridas. Os portugueses têm a noção de o Estado estar
desacreditado e a percepção de ele nem ser pessoa de bem. A culpa
assenta inteirinha sobre a classe política. Por sua vez, a Nação
está enferma, desiludida, pesarosa. E os cidadãos que a constituem
agrupam-se por categorias e núcleos que sentem de modos diferentes a
crise que, reforce-se, atinge mais o numeroso grupo dos
desfavorecidos e a classe média. O Zé-Povinho, coitado, anda à
vela. Mas, duma forma aguda ou doutra mais suave, todos estão
insatisfeitos. O crucial problema centra-se no sistema político,
aprisionado entre faixas partidárias obcecadas pelo Poder; nas
quais, pontifica gente imatura e muito mal preparada para exercitar a
acção política. Também lhes falta saber, competência, seriedade,
determinação e, muitas vezes, uma sincera dedicação à Pátria e
aos valores democráticos. O País não progride; retrocede. A
população não vislumbra melhores condições de vida. Inexistente
uma salutar, autêntica, tolerante convivência entre os cidadãos.
Os políticos e os governantes empenham-se em jogos de promoção
pessoal e do respectivo partido, de disfarces e de confusões, para
iludirem os problemas e mais facilmente baralharem os indígenas. Até
recorrem a destrambelhados expedientes para alijarem
responsabilidades. Nisso são imitados em todos os sectores da
Administração Pública. Quando os maus exemplos partem dos escalões
cimeiros da hierarquia não se estranhem as imitações que se
entranham nos patamares inferiores…
2
– O “Diário
de Aveiro”, edição
de 17 de Agosto corrente, insere uma notícia sob o título de
“Cheiro a esgoto
indigna utente”,
reportada ao novo Serviço
de Urgência do Hospital de Aveiro.
Consta da reportagem:
que houve entupimento de esgotos; que durante algum tempo se sentiu
um cheiro insuportável; que após reclamação de uma senhora e da
ordem para se calar veio um indivíduo que procedeu ao desentupimento
da câmara de visita num espaço contíguo à sala de espera.
Igualmente, dá-se nota que tais trabalhos incomodaram os utentes não
só pelo cheiro nauseabundo mas porque efectuados à vista de todos
os presentes. A referida senhora, bastante agastada, terá
manifestado estranheza pela ocorrência num serviço de urgência
inaugurado há pouco tempo. Depois, o administrador do hospital
interpelado pela jornalista admitiu “ter
conhecimento não oficial do episódio”
e informou que, a ter havido “despejo de bidons com dejectos
naquele momento, frente aos utentes que aguardavam na sala de espera,
não seria muito
cordial isso acontecer”
(os sublinhados são nossos).
Esta
notícia, na sua aparente singeleza e oportuna referência a delgado
acto de produção linguística, envolve aspectos de considerável
importância e de surpreendente revelação de um segredo bem
guardado no território nacional, que devem ser comentados.
3
– Primeiro aspecto - o seu
objecto.
De
realçar o facto de uma obra recentíssima efectuada no hospital de
Aveiro já apresentar a deplorável mazela do mau funcionamento dos
esgotos. Causas: fraca qualidade do projecto ou falta dele?
Incorrecto dimensionamento da rede? Má execução da obra?
Inexistência ou deficiência de fiscalização? Lacuna da aprovação
dos trabalhos? Negligência ou facilidades na recepção provisória
da empreitada? Quanto à apreciação de cordial para o
despejo dos bidons, decerto que nem afectuoso; tão-pouco amistoso…
Se o administrador queria dizer curial, mesmo nesta hipótese,
temos de convir que a acção nem própria; muito menos conveniente…
4
- Segundo aspecto - o
administrador “admite
ter conhecimento não oficial do episódio”.
Vejamos.
É facilmente suposto por gente bem intencionada que o administrador
exerça, num enquadramento oficial, as respectivas funções
intramuros do hospital. O episódio ocorreu nas instalações do
estabelecimento. Estando ele, responsável executivo, no exercício
do cargo, não lhe bastava o seu conhecimento obtido através da
informação dos serviços ou pela verificação pessoal, para o caso
ser considerado oficial? Há sentido de oportunidade, perguntar: o
que é isso do “conhecimento oficial”? Como se processa? Pela
apresentação de uma queixa de algum utente? Em papel timbrado com
assinatura reconhecida pelo notário? Pela declaração formalizada
em auto lavrado perante o senhor administrador, devidamente
testemunhada por pessoas idóneas credenciadas por informação
confidencial do presidente da Junta de Freguesia ou por agentes da
autoridade policial convenientemente uniformizados e quando em
serviço feito por turnos ou escala? Então não é pela observação
pessoal, pelo conhecimento directo dos factos ou pelas informações
dos serviços internos, que o administrador toma “conhecimento
oficial” do que se passa no seu hospital? E considerando que o
administrador tinha tido o designado “conhecimento oficial” em
que consistiriam as consequências daí decorrentes? O que se
alterava no quadro da situação, da sua incongruência e nos devidos
efeitos das acções a desenvolver para que tais ocorrências não
voltem a repetir-se? Será porque o senhor administrador não tomou
“conhecimento oficial” tudo vai continuar como dantes? Como
decorre a gestão normal do hospital se o senhor administrador não
toma “conhecimento oficial” – seja lá isso o que for –
dos acontecimentos, acidentes, transtornos, avarias, incidentes e
quaisquer anomalias e irregularidades que afectem o normal
funcionamento da unidade hospitalar sob sua administração?
Vaticina-se que o administrador não age quando tem conhecimento
não oficial dos acontecimentos, devido à desmotivação, à
lógica do sistema, à falha da chancela e à falta do selo branco,
no indispensável embrulho do famigerado “conhecimento oficial”.
Dado por adquirido o facto de nem lhe chegar “o conhecimento
oficial” – algo chato, incómodo, complicado, difícil de
conseguir e perdível no emaranhado das vontades, no labirinto dos
espaços do estabelecimento e no desconhecimento e na dispersão
(presumida) dos meios de acesso – pondera-se que, eventualmente, os
resultados, os benefícios e os êxitos da gerência, estão
condenados a sumirem nas brumas da ineficácia e da displicência.
Todas
estas interrogações são pertinentes com uma única ressalva que
deixamos em fórmula interrogativa: e se o administrador tem o
conhecimento não oficial das coisas porque, talvez, ele próprio
exerce as funções de administrador na situação de desempenho não
oficial, de praticante à experiência, de amador, interinamente
provido no lugar, sem o adorno das dragonas, do anel inerente à
dignidade do cargo, da capa flamejante, da chancela, do bastão de
comando e do pergaminho onde constem as inerentes responsabilidades?
Sendo esse o caso, está justificado que ele só disponha do
“conhecimento não oficial” de qualquer ocorrência no
hospital. Assim, igualmente, se compreendem as suas limitações de
ordem funcional… – o que, diga-se, vai em desabono das
respectivas tutelas.
5
- Terceiro aspecto extrapolado
para o todo nacional.
Este,
estupendo! Um segredo desvendado em Aveiro. Tal e qual à semelhança
da atitude de uma falsa virgem que em determinado dia, num ajustado
momento, decide levantar a vestidura e mostrar a nudez, para
evidenciar o manifesto deslumbramento e… materializar os almejados
efeitos.
Até
agora todo o mundo da lusa gente se interrogava quanto às razões
porque os nossos políticos e governantes persistiam nos erros, nos
disparates e na desgovernação, apesar das constantes críticas de
que são alvo e de se julgar que alguma coisa lhes devia chegar aos
ouvidos, ser objecto de leitura ou de observação pessoal. E ninguém
atinava na interpretação a dar a esta problemática. Também nós
nos confrontávamos com as dúvidas, os embaraços das questões
levantadas no enredado das confusões habilmente urdidas pelos
grandes artistas da paródia nacional em que está convertida a
política à portuguesa. Faltava-nos identificar o expediente, o
artifício, a manha, o álibi - qual escudo protector - a que
recorriam os governantes para tranquilizarem as próprias
sobressaltadas consciências sempre que eram apanhados com o pé na
poça, a boca na botija ou a mamar desalmadamente, às escondidas,
nas tetas das vacas leiteiras dos pastios oficiais.
6
- Pois bem! Está encontrada a explicação. Da maneira mais
simplória que se poderia conjecturar. Todavia, em conformidade com o
mais atrevido e singular expediente só concebível por super dotadas
mentes altamente evoluídas na matéria e deveras sofisticadas… E
foi aqui, em Aveiro, precisamente no seu estabelecimento hospitalar
de referência oficial, que alguém deu luz à escuridão que nos
deixava atordoados e indecisos.
Os
políticos e os governantes portugueses não acertam no rumo a dar ao
País simplesmente porque, estando-se nas tintas para zelar o
interesse nacional em detrimento das vantagens ou lucros pessoais,
das conveniências dos partidos e dos objectivos prosseguidos pelas
seitas do maior secretismo… são extremamente selectivos e
precavidos: só tomam conhecimento não oficial
das situações das coisas, das loisas e do estado da Nação.
É
isso! Falta-lhes o
conhecimento oficial. E, apropriadamente, dele se desinteressam…
7
- Querem exemplos? Eis alguns: O Alberto João Jardim
todos os anos na festa do seu partido regional, no Chão da Lagoa,
insulta com acinte desrespeitoso e verrina inaudita, os governantes
de Portugal (incluindo presidentes da República). Nunca foi
processado judicialmente. O Instituto de Meteorologia admitiu, para
lugares de especialistas, indivíduos com o 9.º ano de escolaridade,
quando as funções exigem consistente formação em Matemática e
Física – o disparate vai em frente. Faltam verbas para os
guardas-florestais, para a Educação, para a Saúde, para os
equipamentos das Polícias, para combater os fogos eficazmente e para
um rol imenso de necessidades – não há volta a dar. Há anos
muitos deputados fartaram-se de viajar à volta do mundo sem saírem
de Lisboa e, frequentemente, cometem outras tropelias não menos
graves e desprestigiantes – nem há problemas de introspecção e
os processos de averiguações perdem-se nos esconsos do Palácio de
S. Bento. Há dias, Sócrates foi ao Brasil; levou, a reboque,
sessenta jornalistas e numerosa comitiva, segundo o que foi
noticiado. Uma grossa maquia do Orçamento, gasta na viagem, foi à
vela. Como se Portugal pudesse comportar despesas com extravagantes
jornadas turísticas. Inquirimos: esta peripécia
luso-brasileira aconteceu porquê? Damos a resposta: porque,
obviamente, Sócrates não tomou conhecimento oficial da sua
viagem e em nenhum momento se apercebeu da companhia dos figurantes e
dos gastos; estes, passaram-lhe ao lado em trânsito directo e
apressado para as bolsas dos contribuintes... E penas que não se
vêem, que não se sentem, nem se conhecem, é como se não
existissem… Certo, engenheiro Sócrates?
Uma
vez que assim vai sucedendo… temos de acrescentar:
infelizmente, o primeiro-ministro, Sócrates, contempla-se no
conhecimento não oficial de todos esses acontecimentos…
8
- Ficaríamos horas a elaborar a elucidativa lista dos desmandos
da Administração Pública e outras mais coisas. Mas não vale a
pena.
Importa
reter a acabrunhante certeza: Tudo isto existe! Tudo isto é triste!
Tudo isto é nosso incrível e molesto fado.
A
suprema desgraça! Tudo acontece neste País porque os nossos
distintos políticos e governantes disso não tomam conhecimento
oficial. Ficam-se pelo conhecimento não oficial…
Aí,
está a gaita (coisa nenhuma)…
Notícia de última hora – Os
diários de Lisboa, de 20 de Agosto p.p., relatam que o governo da
marca Sócrates, seguindo na esteira dos anteriores de Durão Barroso
e de Santana Lopes, está a contratar uns desenrascados “bons
rapazes” - excelentemente cunhados com o selo de garantia das
veneráveis sociedades que ”zelam pelos bons costumes” - através
da “porta do cavalo”, com dispensa de publicação dos
respectivos despachos de nomeação no “Diário da República”. O
que, diga-se, representa uma providência cautelar… uma vez que ele
está mais acessível, na Internet. Perguntará o leitor: Há
problema? Respondemos: Para o governo deles, nenhum!
O grémio governamental tem do caso
o reconfortante conhecimento não oficial,,.
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