Um texto sem tabus…
CATALINA PESTANA
DEU ENTREVISTA IMPORTANTE…
Brasilino Godinho
http://quintalusitana.blogspot.com
Catalina Pestana foi, até há poucos meses, provedora da Casa Pia, de Lisboa.
Recentemente, deu uma entrevista publicada nas duas últimas edições da revista Tabu. Nela fez a abordagem do processo dos abusos de menores daquela instituição que está sendo julgado há três anos no Tribunal da Boa Hora.
Trata-se de uma peça jornalística do maior interesse público. Um serviço prestado à comunidade. Muito importante para se ajuizar da situação do País no particular domínio da Justiça. Também, um relevante testemunho de quem, no exercício das suas funções de provedora, tomou conhecimento directo das ocorrências, sentiu e viveu os problemas e as angústias das vítimas e se tornou sabedora e depositária de elementos atinentes aos obscuros meandros que influenciam, determinam e protagonizam as políticas, os tráficos de interesses e os jogos de cumplicidades. Afinal, o curso dos acontecimentos, reportados ao citado processo.
Independentemente das interrogações que se poderiam apresentar sobre o enquadramento da entrevista no âmbito das tensas relações existentes entre a Maçonaria e a Opus Dei, correspondentes à luta pela supremacia em várias áreas travada entre o Expresso (de matriz maçónica) e o SOL (este, abrigado no regaço da Opus Dei), não haja dúvidas que estamos perante um facto notável. Pela oportunidade. Pela relevância da personalidade de Catalina Pestana. Pelo seu tom de seriedade. Pelo teor das revelações - que nem o terão sido para algumas pessoas melhor informadas e mais atentas no acompanhamento das intervenções avulsas dos envolvidos e das subterrâneas manobras da grande fraternidade do compasso e do esquadro.
Igualmente, de enaltecer a coragem de uma mulher decidida a dar a protecção possível às crianças agredidas. E empenhada no combate pró “reino da Justiça” que nos espera a todos que prezamos os valores da civilização, com activo repúdio da barbárie, da selvajaria e da criminalidade - seja ela de colarinho branco, de camisa negra, ou de calça de ganga.
Para além das pertinentes apreciações focando a importância das declarações de Catalina Pestana, expostas nos antecedentes parágrafos, há que salientar que a entrevista também assume relevo pelos aspectos negativos que nela transparecem.
Desde logo, o facto de Catalina Pestana ter afirmado: “Continuam a haver abusadores dentro da Casa Pia e redes externas que usam os miúdos para abusos sexuais; o procurador já abriu um inquérito”.
Noutro trecho da entrevista Catalina Pestana reiterou: “Não tenho dúvida nenhuma de que ainda existem abusadores internos na Casa Pia. E tenho fortes suspeitas de que redes externas continuam a usar miúdos da Casa Pia para abusos sexuais. No dia 10 de Maio (eu saí a 11), a última coisa que fiz foi escrever ao senhor procurador-geral da República e contar-lhe as suspeitas que tenho”.
Tais declarações suscitam a elementar interrogação: Se Catalina Pestana, ao tomar posse do cargo de provedora, estava ciente da situação que se vivia na Casa Pia e durante os anos que exerceu o cargo foi adquirindo a convicção, sem margem para dúvidas, de que continuavam a existir “abusadores internos”, então por que não cortou o mal pela raiz dando os passos necessários nesse sentido? Por que não agiu em tempo oportuno e em força? O que suscita um outro reparo às jornalistas entrevistadoras: Por que não fizeram a interrogação que se impunha face a esta parte negligenciada das afirmações de Catalina Pestana? Esta é uma omissão que deslustra o trabalho de Ana Paula Azevedo e de Felícia Cabrita. E não só delas. Pois estranha-se que, a nível das chefias e do director do jornal, tenha passado em claro tão grande falha de imprecisão e lamentável falta de sentido objectivo. Daí, igualmente por este ângulo de intervenção de duas conceituadas profissionais da comunicação social, termos classificado a entrevista de importante; até porque a peça constitui um exemplo de jornalismo menos atento e pecando porque trabalhada de forma displicente e pouco desperta para a oportunidade de esclarecer e explicitar um aspecto da actuação da ex-provedora que se afigura esquisito e algo inexplicável.
Não obstante este reparo, louve-se a coragem de Catalina Pestana que se mostrou agastada com as sucessivas peripécias do processo e dos estranhos acontecimentos que lhe estão associados.
Realce-se que Catalina Pestana pôs em destaque o escândalo do regresso de Paulo Pedroso à Assembleia da República, os sofrimentos dos miúdos vítimas dos abusos e as actuações da Maçonaria que, segundo ela, “tem um defeito tenebroso: os seus membros protegem-se uns aos outros” (afirmação que não trouxe qualquer novidade ao Zé-Povinho).
Bastante elucidativa a observação que a entrevistada fez a propósito dos novos Códigos Penal e de Processo Penal. À pergunta: Como é que lida com um julgamento que se arrasta há três anos? Respondeu: Vai demorar ainda mais e só agora percebi porquê. É porque era preciso que saísse o actual Código Penal, cujo art.º 30.º, como disseram vários juristas, foi feito expressamente para a Casa Pia. Antes, um crime de abuso sexual contava as vezes que uma vítima era abusada; o actual Código Penal diz que crimes continuados de abusos sexuais contam como um único crime. Eu percebo por que é que foi preciso esticar no tempo este processo, com o tribunal a permitir a repetição de perguntas ad infinitum. Eu própria fui ouvida em audiência durante quase três meses, com os advogados todos a perguntarem aquilo que eu já tinha respondido três, quatro, cinco vezes. E às vítimas aconteceu o mesmo”.
Assim, vai passando um tempo de desgraças nos vários sectores de actividade da sociedade portuguesa. Incluindo a Justiça.
Lá dizia, uns escassos anos atrás, o maçon e socialista, António Vitorino: HABITUEM-SE!
Decerto, que esse é o desejo da “discreta” irmandade das lojas e das oficinas.
Mas, será que os portugueses vão nisso?
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