O USO DA LÍNGUA EM PORTUGAL E EU O
PECADOR INCORRIGÍVEL, ME CONFESSO…
Brasilino Godinho
19/12/2021
01. Há poucos dias um leitor enviou-me uma mensagem apontando-me algumas virtudes na minha escrita mas, também, uma falha que me pareceu ele considerar como desagradável pecado: meus textos perdiam brilho por serem extensos.
Como, eventualmente, haverá outros leitores fazendo idêntica depreciação devo trazer a público a minha confissão de pecador incorrigível que, frequentemente, expõe tal faceta pecaminosa…
Claro que tais leitores, aqui e agora qualificados como meus confessores, ficam dispensados de cogitarem as penitências a aplicar ao prevaricador; visto que ele é irredutível na habituação transgressora da actual tendência em Portugal de aligeirar os teores dos escritos dados à estampa na imprensa e nos sítios da Internet…
02. Escrita a introdução, passo a formular algumas observações de interesse para os leitores ficarem cientes da abrangência e objecto da questão colocada em foco nesta crónica brasiliana.
Desde logo, observo que - na conjuntura actual e segundo o que é a deficiente, simplista e bastante rasteira prática jornalística vigente na Comunicação Social e noutros sectores da sociedade - o reparo do leitor é algo pertinente.
Também, de imediato, anoto que há dezenas de anos escrevo e publico livros, crónicas e textos avulsos (estes, pequenas observações ou simples e ligeiros apontamentos – umas e outros com pouca frequência). Sempre tive a percepção de que algumas pessoas se poderão enfastiar ou cansar em fazer leituras dos meus extensos escritos (felizmente, que nunca terão desmaiado…). Tem sido um risco conscientemente assumido.
Explico porquê.
03. Neste nosso tempo tornou-se hábito generalizado dos cidadãos que escrevem para o público, tratar todos os assuntos, questões, temas e análises pela rama (muito superficialmente) atendendo, sobremaneira, à ideia de que as pessoas não quererão ocupar seus tempos com leituras de longos textos. E atendendo que tudo querem fazer à pressa e atabalhoadamente. Certamente, cumprindo à risca a recomendação diária da senhora locutora da RTP: procurar fazer as coisas de modo a tudo parecer-lhes mais fácil, embora tenham o estafante trabalho de encontrar os lados positivos das suas vidas… (Gaita! Para o que um pacato cidadão estaria guardado… pois que nem lhe é garantido que encontre o benfazejo lado).
Inúmeros portugueses tendem a muito considerar realizável segundo a lei do menor esforço, sem se darem a ocupar algum tempo para conhecer a essência das matérias e nem se preocuparem em digerir o que lêem a correr e em diagonal. Daí que até na nova vaga de jornalistas e alunos dos ensinos secundário, médio e superior eles são instruídos, nos seus cursos disciplinares, a encurtar ao máximo os textos que escrevem e com excessivas restrições do léxico. Pelo que os resultados teriam, forçosamente, que ser compaginados no desastre linguístico actualmente generalizado na comunidade portuguesa.
No uso da Língua fala-se mal; escreve-se pior. Desconhece-se a higiene da alma. Não se cultiva o pensamento. Ignora-se o que seja o regular exercício do raciocínio. A filosofia foi um ar que lhe deu e se há perdido nas cavernas mui subterrâneas onde se refugiam a ignorância, a idiotia e a incultura encartadas. Estão-se criando robots humanos, sem alma e falhos de cultura minimamente geral, que mais usam e abusam do inglês e do chinês. O português está indo à vela por mares tenebrosos. E ninguém surge empenhado em evitar o naufrágio de uma língua que é das mais ricas, importantes e faladas do mundo.
04. Tem sido minha norma aplicada nas actividades de escrita fazer o que estiver ao meu alcance para contrariar tal tendência que reputo ser impeditiva e prejudicial para a generalização da cultura, para a comunicação interpessoal, para se alcançar a imprescindível adequação a elementares regras civilizacionais e ao pleno desfrute da cidadania e, até, com bons reflexos na administração do país.
E muito do que de irregular se nota actualmente no domínio das empobrecidas linguagens falada e escrita, assenta na superficialidade com que se aprende, se lê, se ensina nos cursos básico, secundário, médio, se abordam as questões e as matérias e se tem a veleidade de não aprofundar a essência das coisas que se nos deparam diariamente. Anomalias que se repercutem no Ensino Superior e que de alguma forma, igualmente, nele se manifestam, nomeadamente na latente hostilidade às Humanidades, incluindo as Ciências Sociais.
05. Aliás, nos meus textos hei cuidado de penetrar analiticamente as essências das matérias contempladas nas respectivas explanações o que, necessariamente, se impõe pela importância dos assuntos focados. Tal desiderato obsta a que haja relativamente a eles hipóteses de reduzir espaços pois que os temas seriam insuficientemente analisados.
Por outro lado tendo presente que ao leitor atento e interessado na leitura do texto e no decorrer dela, vão-se-lhe suscitando dúvidas, despertando interrogações quanto a hipotéticos desenvolvimentos/aprofundamentos das matérias contempladas na peça escrita e mesmo dando a azo à ponderação de novas questões e lucubrações mentais; hei por bem prevê-las e corresponder com as atinentes explanações que, eventualmente, satisfaçam ou elucidem a pessoa; pelo menos com a vantagem de ela ficar conhecendo a opinião do autor; esta, tão abrangente quanto lhe foi possível alcançar face às circunstâncias e condicionantes que subjazem no acto de elaboração da escrita.
É que pretendo ser esclarecedor e que cada prosa seja o mais abrangente, específica, objectiva e, se possível, per se não desprezível obra literária. Para isso usando, com apreciável abrangência, o magnífico, vasto e riquíssimo património linguístico que é a LÍNGUA PORTUGUESA.
Se outra fosse a modalidade superficial da minha escrita não estaria habilitado a editar em livro as crónicas que vou escrevendo; como aconteceu recentemente com a publicação dos dois volumes (I e II) da obra APONTAMENTOS BRASILIANOS.
06. Face ao exposto e pelo respeito que tenho por mim próprio e pelos amigos e leitores, não quero, não posso, nem devo, alterar o modus faciendi de elaboração da escrita brasiliana.
Não desejaria decepcionar os leitores desagradados com a extensão das crónicas de Brasilino Godinho. Mas, paciência… Estou consciente que não posso agradar a toda a gente que lê os meus textos. Caso para relembrar e os leitores tomarem referência: também noblesse oblige!
Post Scriptum. Não me canso de repetir: Escrevo com activo repúdio do abominável Novo Acordo Ortográfico de 1990. Ele, explícito reflexo da profunda degradação sociopolítica em que se encontra Portugal, com a qual não me conformo e que resolutamente denuncio e combato.
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