REVISTA ENVELHECER
ENTREVISTA DE BRASILINO GODINHO
(Continuação da primeira parte)
Manuel de Almeida, da Lusa, assina um artigo intitulado “Ministro da Segurança Social vai defender na ONU o potencial dos idosos”. Este título só pode ser uma brincadeira, como afirma num dos seus Apontamentos? Pode explicar-nos porque não acredita de tal defesa?
A pergunta julgo que obriga a algumas correcções.
A primeira tem a ver com o tempo verbal “assina”. Diria que o jornalista da Lusa assinou in illo tempore o artigo focando a ida do Ministro Vieira da Silva à ONU logo semanas depois do encontro internacional de 22 de Setembro de 2017, realizado em Lisboa, sob a égide da ONU, com participação de ministros oriundos de 52 países. Actualmente o cargo ministerial já não é ocupado por Vieira da Silva.
Quanto à defesa do potencial dos idosos, outras pessoas, delegadas à conferência, a efectuaram com eficiência tal que teve consagração na Declaração Universal dos Direitos dos Idosos. O Ministro Vieira da Silva aproveitou a onda; fez breves declarações de circunstância, para não ficar mal na fotografia.
Passo ao lado da “brincadeira” porque o assunto é mui importante e não se compadece com gracejos. Porém, aponto que de imediato comentei desfavoravelmente a ida da ministerial criatura à ONU, pois que a defesa dos idosos já tinha tido lugar e aprovação expressa na assinada Declaração Universal. Foi uma viagem desprovida de interesse para a causa dos idosos e improdutiva como logo escrevi em crónica sobre o caso.
Cingindo-me ao “potencial de tal defesa” digo que foi apurado e incluso na referida Declaração Universal. Mas isso é uma coisa de apreciar como reconhecimento universal dos direitos dos idosos e das potencialidades que lhes são adstritas; e outra coisa condenável é o desprezo que o nosso governo manifesta persistentemente para com eles, desperdiçando a enorme riqueza da massa cinzenta de milhares de idosos com direito a continuar a ter digna vida activa e a servirem devotadamente Portugal – o que sendo muito negativo é levado, acintosamente, à prática pelos altos dignitários do Poder em Portugal, num decurso de incumprimento das normas e objectivos delineados na Declaração Universal de Lisboa.
Em Portugal, os governantes desprezam as pessoas idosas? Será esta a explicação para a inexistência de uma estratégia para o Envelhecimento Ativo e Saudável?
É relativamente fácil a uma pessoa dotada de faculdades de alma aperceber-se de que os idosos estão marginalizados na sociedade portuguesa - e desprezados pelos poderes central e autárquicos e por alguns sectores da sociedade.
Neste quadro de desregulação social avulta a elucidativa circunstância de na Assembleia da República não haver um único deputado idoso a representar o que no próprio Palácio de S. Bento já foi apelidado de “peste grisalha”. Repare-se na carga pejorativa contida na expressão e no facto de que, no plenário, nem uma voz se ergueu a protestar contra tal ofensa à dignidade de milhares pessoas respeitáveis deste país.
Esta observação demonstra quanto são desprezados tantos milhares de portugueses a quem nem são asseguradas condições de vida digna e que no caso de reformados da função pública todos os anos se contemplam com reduções dos valores monetários das suas pensões miseráveis de mui triste sobrevivência; mesmo quando “obsequiados” com ridículos, infames, aumentos mensais; os quais logo são desvalorizados com os agravamentos de impostos directos e indirectos e aumentos dos custos dos bens alimentares, combustíveis, vestuário, calçado, medicamentos, consultas médicas, transportes, rendas de casa, água, gás, telefone, electricidade, etc..
Ou seja: o governo dá indecente “esmola” com a mão direita e, de imediato usando ardilosos expedientes, com a esquerda retira sorrateiramente algo mais. Deste modo enganador e desonesto ele, sistematicamente, vai empobrecendo as populações e agravando as precárias condições de vida da maioria dos aposentados e trabalhadores portugueses.
Uma escandalosa e até mortífera política que atinge principalmente as pessoas da terceira idade, que sem meios materiais para sobreviverem com decência são a breve ou médio prazos encaminhadas para a última morada. Agora encaminhamento mais facilitado pelos efeitos mortíferos da Pandemia Covid 19, de que nunca saberemos o exacto número de vítimas.
E de tal calamidade promovida pelos governantes não se elaboram estatísticas, visto que lhes interessa ocultá-la o mais possível e nesse propósito há que escamotear com fingimentos vários a dramática realidade.
Logo conexa com esta política de concretizar o desejado extermínio da “peste grisalha” e por ainda não haver maneira de acabar com a “peste parlamentar”, por mim já várias vezes denunciada, aí temos operando aqueloutra política governamental de prosseguir a “inexistência de uma estratégia para o Envelhecimento Ativo e Saudável” com nítida violação da Declaração Universal dos Direitos dos Idosos. Nessa faceta negativa da sua actividade é o governo coerente.
Assim apresento a explicação que me é solicitada na segunda pergunta antecedente.
O idadismo, preconceito baseado na idade, é a 3.ª forma de discriminação depois do racismo e sexismo. Um claro exemplo de idadismo foi o despedimento do jornalista Henrique Garcia da TVI. No seu livro aponta o dedo ao Sindicato dos Jornalistas e ao ministro dos “Despedimentos dos Idosos”. Quer comentar este caso?
A discriminação dos idosos como qualquer outra relacionada com o racismo e sexismo, é sempre condenável e não devia acontecer numa sociedade regularmente estruturada, em que se respeitassem os direitos cívicos, se cumprissem os normativos da Declaração Universal dos Direitos do Homem e a Declaração Universal dos Direitos dos Idosos e na qual também prevalecessem os valores da Fraternidade, Liberdade e Igualdade.
Só que tudo isso pressupõe a existência de um Estado de Direito – o qual não tem formatação sociopolítica em Portugal. O Estado de Portugal tem configuração maçónica – o que tem implicações várias e consequências bastante nocivas no descalabro funcional da Nação. Ele, também um Estado paradigma de hipocrisia institucionalizada a todos os níveis da governação e da sociedade.
Por outro prisma de análise crítica há que admitir que tais circunstâncias decorrem da degradação geral do País a que se chegou por a maioria da população se manter há séculos num estádio de analfabetismo crónico nos três graus: primário, funcional e cultural.
Um estádio de menoridade cívica que muito facilita o predomínio de agentes políticos empenhados em o manter indefinidamente e até o aprofundar, para mais intensamente explorarem e dominarem, sem resistência activa a nação dos milhões de indígenas humilhados, ofendidos, maltratados, em transe existencial, precedendo o encaminhamento para os cemitérios.
Daí que sob o impulso de um clima vicioso de políticas desconformes e de corriqueiras práticas condenáveis, o idadismo sendo atitude preconceituosa e discriminatória com base na idade, atingindo sobretudo os idosos, se manifeste a todo o instante nos vários sectores da Nação e per se constitua um reflexo de grande atraso civilizacional.
O caso de Henrique Garcia, não sendo invulgar, tornou-se emblemático por ser figura pública e ter tido bastante divulgação nos órgãos da Comunicação Social. Julgo que o Sindicato dos Jornalistas deveria ter tomado vigorosa posição de repulsa pelo despedimento do jornalista da TVI com fundamento no factor idade (completar 70 anos).
Claro que a ocorrência de tal caso transmite ilustração, pertinência e objectividade às considerações que expusemos nos antecedentes parágrafos.
Para que tem servido, na prática, a Declaração Universal de Lisboa, de 22 de Setembro de 2017, dos Direitos dos Idosos?
Sem necessidade de me alongar na resposta e por carência de matéria factual, afirmo: Em Portugal, para muitíssimo pouco; de ocasional e parcelar, sobremodo restrito.
O que falta fazer para que vivamos numa comunidade para todas as idades?
Faltam imensas coisas!
Em primeiro lugar: EDUCAR os cidadãos. Uma imperativa tarefa a desenvolver nas duas próximas gerações.
Em segundo lugar: Recorrendo a um ENSINO de excelência e com recurso à EDUCAÇÃO, entretanto ministrada a milhares de cidadãos, criar um genuíno ESTADO DE DIREITO em Portugal.
A aprendizagem ao longo da vida é um pilar fundamental para uma longevidade feliz?
Digo: sem dívida que “é pilar fundamental para uma longevidade feliz.”. Outrossim, meio adjuvante de a prolongar em conformidade de plena realização pessoal.
Brasilino Godinho tendo sido autodidacta desde a adolescência, caloiro universitário aos 77 anos de idade e aos 85 anos alcançado o Doutoramento, faculta provas convincentes; materializa testemunho eloquente e inquestionável.
Finalizo a entrevista expressando o desejo de que estas minhas declarações não sejam reproduzidas, em letra de forma/imprensa, segundo o Novo Acordo Ortográfico; dado que falo e escrevo com activo repúdio por tão aberrante e desvalorizado instrumento linguístico.
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