Leitor,
Pare!
Leia!
Pondere!
Decida-se!

SE ACREDITA QUE A INTELIGÊNCIA

SE FIXOU TODINHA EM LISBOA

NAO ENTRE NESTE ESPAÇO...

Motivo: A "QUINTA LUSITANA "

ESTÁ SITUADA NA PROVÍNCIA...

QUEM TE AVISA, TEU AMIGO É...

e cordialmente se subscreve,
Brasilino Godinho

domingo, fevereiro 10, 2019



PORTUGAL ESTÁ VICIADO EM CRISES
Parte II
(Continuação da Parte I)
Brasilino Godinho

01. Se bem ponderarmos e encararmos a questão com racionalidade intui-se que se o nascimento é o princípio de vida fora do ventre materno, também será o início de percurso irreversível rumo à morte.
Algo parecido sucedeu com Portugal.

02. Em início desta segunda parte vamos restringir a apreciação do tema de Portugal viciado nas crises, ao importante aspecto elucidativo de como essa viciação terá sido iniciada com mais insistência e pertinácia a partir da questão dos Descobrimentos.

03.Descobrimentos que se constituíram como valiosos factores de o País lograr atingir elevada grandeza, assinalado prestígio, grande influência na Europa e avultadas riquezas. Mas se assim se consumou o sucesso do movimento das descobertas oceânicas, também em simultâneo, e logo no século XV, se começou a notar a decadência da nação portuguesa; a qual, se foi acentuando ao compasso do tempo, atravessando vários séculos, até chegar à actualidade.

04. Para não irmos mais longe no espaço temporal e mais fundo na pormenorização dos factos e das situações, bastará tomarmos conhecimento de que o poeta Sá de Miranda, no século XVI foi, ele próprio, lúcida testemunha da ameaçadora desagregação social que despontava nos horizontes da capital do reino português.
Na Carta a D. João III, Sá de Miranda chamou a atenção do monarca para o abandono a que a agricultura estava voltada (sobretudo, resultante de a população ser mobilizada para outras actividades e para a participação nas tarefas relacionadas com a marinhagem, construção naval e como equipagens para as expedições náuticas). Também alertando o rei para a perversa e exagerada prática do luxo e, ainda, para os escândalos e vícios da sociedade e da corte.

05. Para além de importante testemunha de tal estado de coisas, Sá de Miranda, foi ele próprio elemento vivo da crise na Igreja, decorrente da devassidão e do desapego aos valores da integridade moral, da fidelidade aos princípios e juramentos relativos às normas e regras do celibato, da pureza e da intrínseca seriedade e inequívoca honestidade exigíveis aos dignitários religiosos.

06. Uma situação pessoal que decorreu do facto de Sá de Miranda ser filho de um cónego da Santa Madre Igreja, na Diocese de Coimbra e de mãe solteira – ou seja um vivo elemento comprovativo de como já, naquela época, o celibato e a castidade dos clérigos andava pelas ruas da amargura de muitos pecados e prevaricações mais ou menos encobertas, disfarçadas ou hipocritamente expostas. Diga-se que nesse percalço existencial o insigne poeta, introdutor do soneto em Portugal, obviamente que não teve culpa. Terá sido vítima circunstancial, se considerarmos que, naquela época, ser filho de padre não era coisa bem vista pela arraia-miúda (no nosso tempo já não é assim; até tivemos um presidente da República, filho de padre. Circunstância, também ela, demonstrativa da crise de valores de que está possuída a nação portuguesa).

07. Porém, há que realçar as importantes facetas da rica personalidade de Sá de Miranda; nomeadamente, o seu carácter impoluto, a sua coerência e ter sido o primeiro poeta a ocupar-se com os encontros e desencontros do seu ego, de que deu notória evidência na seguinte composição poética: “Comigo me desavim,/Sou posto em todo perigo;/Não posso viver comigo/Nem posso fugir de mim.”
De anotar também que é dele a autoria da célebre composição poética: “Homem de um só parecer,/dum só rosto e d’uma fé,/ dantes quebrar que torcer/outra cousa pode ser,/mas da Corte homem não é”.
Outrossim de realçar que Sá de Miranda, terá sido o primeiro poeta a declarar que sê-lo em plenitude, é sentir como profeta e dever denunciar os vícios da sociedade, sobretudo da Corte e propor formas de vida em harmonia com os sadios e regulares interesses das populações.

08. Enfim, e retornando incisivamente ao assunto aqui objecto da nossa análise, centrado na incidência temporal que fixámos a partir do século XVI, as malfadas crises da Monarquia, da Sociedade e da Igreja, marcaram, indelevelmente, o início de uma persistente, vergonhosa, indecente, prejudicial e sofredora situação de um enorme amontoado de crises, que tanto vem contribuindo para a terrível degradação da heterogénea nação que é, afinal, a sociedade dos inúmeros aflitos e atormentados portugueses. A qual, calamidade, se configura como perene.
(continua em Parte III)